A porta da estalagem fechou-se com um estrondo atrás do homem de cabelos brancos, e ele se virou e a fuzilou com o olhar. Magro, ele seria alto se não fossem os ombros encurvados, e andava com uma leveza tal que disfarçava a idade. Seu manto parecia um amontoado de remendos, de formas e tamanhos diferentes, agitando-se a cada rajada de vento com mil cores. O tecido era muito espesso, Rand viu, apesar do que Mestre al’Vere dissera, com os remendos meramente costurados à guisa de decoração.
— O menestrel! — Egwene sussurrou, empolgada.
O homem de cabelos brancos girou, o manto se abrindo. Seu casaco comprido tinha estranhas mangas folgadas e bolsos grandes. Bigodes grossos, tão brancos quanto a cabeça, estremeciam ao redor da boca, e o rosto era encarquilhado como uma árvore que já vira tempos difíceis. Ele fez um gesto imperioso para Rand e os outros com um cachimbo longo, de entalhes intricados, que deixava um tênue rastro de fumaça. Olhos azuis espiavam por baixo das espessas sobrancelhas brancas, perscrutando tudo que olhavam.
Rand fitou os olhos do homem quase tanto quanto o restante do corpo. Todos nos Dois Rios tinham olhos escuros, assim como a maioria dos mercadores e seus guardas, e todos que ele já tinha visto. Os Congars e os Coplins haviam zombado de seus olhos cinzentos até o dia em que ele finalmente dera um soco no nariz de Ewal Coplin; a Sabedoria ficara em cima dele por causa disso. Ele se perguntava se existiria um lugar onde ninguém tivesse olhos escuros. Talvez Lan venha de lá também.
— Que espécie de lugar é este? — perguntou o menestrel, com uma voz grave que, de certo modo, soava mais pomposa do que a de um homem comum. Mesmo a céu aberto, ela parecia preencher um grande salão e ressoar nas paredes. — Os caipiras na aldeia da colina me disseram que eu conseguiria chegar aqui antes de escurecer, mas se esqueceram de dizer que só se eu partisse bem antes do meio-dia. Quando eu chego, finalmente, gelado até os ossos e pronto para uma cama quente, seu estalajadeiro resmunga sobre a hora, como se eu fosse um criador de porcos sem eira nem beira e seu Conselho da Aldeia não tivesse implorado para que eu exibisse minha arte neste seu festival. E ele nem sequer me disse que era o Prefeito. — Parou para respirar, fuzilando a todos com o olhar, mas voltou a falar no mesmo instante. — Quando eu desço para fumar meu cachimbo à lareira e tomar uma caneca de cerveja, cada homem no salão me encara como se eu fosse seu pior cunhado pedindo dinheiro emprestado. Um vovô velho começa a me admoestar sobre o tipo de histórias que eu deveria ou não contar, e então uma mocinha grita comigo para que eu saia, e me ameaça com um porrete enorme quando não saio com a rapidez que ela espera. Alguém já ouviu falar de um menestrel sendo tratado assim?
O rosto de Egwene congelou, a expressão dos olhos arregalados de fascínio por ver um menestrel em carne e osso em conflito com o desejo de defender Nynaeve.
— Com seu perdão, Mestre Menestrel — disse Rand. Sabia que ele próprio estava sorrindo como um bobo. — Aquela é a nossa Sabedoria, e…
— Aquele fiapinho de moça? — exclamou o menestrel. — Uma Sabedoria de aldeia? Ora, naquela idade ela deveria era estar flertando com os rapazes em vez de ficar prevendo o tempo e curando os doentes.
Rand mudou de posição, incomodado. Torceu para que Nynaeve jamais ouvisse a opinião do homem. Pelo menos, não até que ele tivesse terminado de se apresentar. Perrin se encolheu com as palavras do menestrel, e Mat assoviou sem emitir som algum, como se ambos pensassem como Rand.
— Os homens eram o Conselho da Aldeia — Rand continuou. — Tenho certeza de que eles não pretendiam ser rudes de forma alguma. Sabe, nós acabamos de saber que está acontecendo uma guerra em Ghealdan, e que um homem afirma ser o Dragão Renascido. Um falso Dragão. As Aes Sedai estão indo de Tar Valon para lá. O Conselho está tentando decidir se estamos em perigo aqui.
— Essa notícia é velha, até mesmo em Baerlon — disse o menestrel, despreocupado —, e olhe que aquele é o último lugar do mundo a ouvir qualquer coisa. — Ele fez uma pausa, olhando a aldeia ao seu redor, e acrescentou secamente: — Ou quase o último. — Então seus olhos caíram sobre o carroção na frente da estalagem, agora sozinho, com os cabeçalhos no chão. — Pois bem. Achei que tinha reconhecido Padan Fain lá dentro. — Sua voz ainda era grave, mas a ressonância havia desaparecido, substituída por desprezo. — Fain sempre foi de levar notícias ruins com rapidez. E, quanto piores, mais rápido. Ele é mais corvo do que gente.
— Mestre Fain vem com frequência a Campo de Emond, Mestre Menestrel — disse Egwene, uma ponta de desaprovação finalmente surgindo no meio de seu deleite. — Ele está sempre cheio de risos, e traz muito mais notícias boas que ruins.
O menestrel a olhou por um momento, então abriu um sorriso.
— Ora, que moça adorável! Deveria ter botões de rosa nos cabelos. Infelizmente, não posso tirar rosas do ar, não este ano, mas o que acha de ficar ao meu lado amanhã durante uma parte de minha apresentação? Para me entregar a flauta quando eu pedir, assim como outros aparatos. Eu sempre escolho a garota mais bela como minha assistente.
Perrin sorriu com desdém, e Mat, que sorria assim antes, gargalhou. Rand piscou, surpreso; Egwene o olhava, furiosa, e ele nem sequer havia sorrido. Ela se endireitou e falou, muito calma.
— Obrigada, Mestre Menestrel. Seria um prazer ajudá-lo.
— Thom Merrilin — disse o menestrel. Todos ficaram olhando para ele. — Meu nome é Thom Merrilin, não Mestre Menestrel. — Ele ajeitou o manto multicolorido sobre os ombros, e subitamente sua voz pareceu mais uma vez reverberar em um grande salão. — Outrora um Bardo da Corte, agora estou de fato elevado ao alto posto de Mestre Menestrel, mas meu nome é simplesmente Thom Merrilin, e menestrel é apenas o título que me glorifica. — E fez uma mesura tão elaborada com floreios de seu manto que Mat bateu palmas, e Egwene murmurou em tom apreciativo.
— Mestre… hã… Mestre Merrilin — disse Mat, sem saber exatamente que forma de tratamento adotar a partir do que Thom Merrilin dissera —, o que está realmente acontecendo em Ghealdan? O senhor sabe de alguma coisa sobre esse falso Dragão? Ou sobre as Aes Sedai?
— Por acaso pareço um mascate, garoto? — resmungou o menestrel, batendo o cachimbo na palma da mão. Então fez o cachimbo desaparecer no interior do manto, ou do casaco; Rand não sabia onde nem como. — Sou um menestrel, não um mexeriqueiro. E faço questão de nunca saber de nada sobre as Aes Sedai. É muito mais seguro assim.
— Mas a guerra… — começou Mat, ansioso, porém foi interrompido por Mestre Merrilin.
— Nas guerras, garoto, tolos matam outros tolos por causas tolas. Isso é tudo que qualquer um precisa saber. Estou aqui pela minha arte. — Subitamente ele apontou um dedo para Rand. — Você, rapaz. Você é alto. Embora ainda não tenha crescido tudo que tem para crescer, duvido que haja outro homem na região com sua altura. Também não há muita gente na aldeia com olhos dessa cor, aposto. O fato é que você tem a largura de um cabo de machado de um ombro a outro e é alto como um Aiel. Qual é o seu nome, rapaz?
Rand o deu com hesitação, sem saber se o homem estava zombando dele ou não, mas o menestrel já havia voltado a atenção para Perrin.
— E você tem quase o tamanho de um Ogier. Ou perto disso. Como se chama?
— Só se eu subisse nos meus próprios ombros. — Perrin riu. — Receio que Rand e eu sejamos apenas sujeitos comuns, Mestre Merrilin, não criaturas inventadas de suas histórias. Eu sou Perrin Aybara.
Thom Merrilin cofiou uma das pontas de seu bigode.
— Ora, ora. Criaturas inventadas de minhas histórias. É isso o que elas são? Vocês, rapazes, são bem viajados então, ao que parece.
Rand ficou de boca fechada, agora certo de que estavam sendo alvo de uma brincadeira, mas Perrin falou:
— Nós todos já fomos até a Colina da Vigília e até Trilha de Deven. A maioria das pessoas daqui não foi tão longe. — Ele não estava se gabando; Perrin raramente fazia isso. Só estava dizendo a verdade.
— Também já vimos o Charco — acrescentou Mat, e ele, sim, parecia se gabar. — É o pântano no fim da Floresta das Águas. Absolutamente ninguém vai até lá, pois o local está cheio de areia movediça e lodaçais… só a gente. E ninguém vai às Montanhas da Névoa também, mas nós fomos uma vez. Ao sopé delas, pelo menos.
— Até lá? — o menestrel murmurou, agora sem parar de esfregar os bigodes.
Rand achou que ele estava escondendo um sorriso, e viu que Perrin tinha a testa franzida.
— Dá azar subir as montanhas — afirmou Mat, como se precisasse se defender por não ter ido além. — Todo mundo sabe disso.
— Isso é bobagem, Matrim Cauthon — interrompeu Egwene, zangada. — Nynaeve diz que… — Ela se deteve, as bochechas corando, e o olhar que dirigiu a Thom Merrilin já não era tão amigável quanto antes. — Não é correto fazer… Não é… — O rosto dela ficou mais vermelho, e ela calou-se. Mat piscou, como se começasse a desconfiar do que estava acontecendo.
— Você tem razão, criança — disse o menestrel, contrito. — Peço desculpas humildemente. Estou aqui para entreter. Ah, minha língua sempre me meteu em apuros.
— Talvez não tenhamos viajado tão longe quanto você — disse Perrin sem rodeios —, mas o que a altura de Rand tem a ver com isso?
— O seguinte, rapaz: daqui a pouco vou deixar você tentar me levantar, mas você não será capaz de tirar meus pés do chão. Nem você nem seu amigo alto ali… Rand, é isso?… Nem nenhum outro homem. Então, o que acha disso?
Perrin deu uma risada de desdém.
— Acho que consigo levantar você agora mesmo.
Mas, quando ele deu um passo à frente, Thom Merrilin fez um gesto para que recuasse.
— Depois, rapaz, depois. Quando houver mais gente para assistir. Um artista precisa de plateia.
Um grupo havia se reunido no Campo desde que o menestrel deixara a estalagem, de rapazes e moças a crianças, que espiavam, quietas e de olhos arregalados, por trás dos espectadores mais velhos. Todos pareciam estar esperando coisas milagrosas do menestrel. O homem de cabelos brancos correu os olhos por eles — parecia estar contando —, depois balançou ligeiramente a cabeça e suspirou.
— Suponho que seja melhor eu lhes dar uma pequena amostra. Assim vocês podem correr e contar para os outros. Hein? Só um gostinho do que verão amanhã no festival.
Ele recuou um passo e, subitamente, deu um salto, contorcendo-se em uma cambalhota e indo pousar de frente para eles, em cima do velho alicerce de pedra. Além disso, três bolas — vermelha, branca e preta — começaram a dançar entre suas mãos antes mesmo que ele pousasse.
Um som suave veio dos espectadores, meio de assombro, meio de satisfação. Até Rand esqueceu sua irritação. Ele abriu um sorriso espontâneo para Egwene e recebeu outro, deliciado, em retribuição, e então ambos se viraram para olhar para o menestrel abertamente.
— Vocês querem histórias? — declamou Thom Merrilin. — Pois eu tenho histórias, e as darei a vocês. Eu as farei ganhar vida diante de seus olhos. — Uma bola azul juntou-se às outras vinda de algum lugar, depois uma verde e outra amarela. — Histórias de grandes guerras e grandes heróis para os homens e meninos. Para as mulheres e moças, todo o Ciclo Aptarigino. Histórias de Artur Paendrag Tanreall, Artur Asa-de-gavião, Artur, o Grão-rei, que um dia governou todas as terras do Deserto Aiel até o Oceano de Aryth, e mesmo além. Histórias maravilhosas de gente estranha e terras estranhas, do Homem Verde, de Guardiões e Trollocs, de Ogier e Aiel. Os mil contos de Anla, a Sábia conselheira. “Jaem, o Matador de Gigantes”. Como Susa domou Jain, o Viajante. “Mara e os três reis tolos”.
— Conte-nos sobre Lenn — pediu Egwene. — Como ele fugiu para a lua na barriga de uma águia feita de fogo. Conte sobre sua filha Salya caminhando entre as estrelas.
Rand olhou para ela pelo canto do olho, mas Egwene parecia totalmente concentrada no menestrel. Ela nunca gostara de histórias de aventuras e longas jornadas. Suas favoritas sempre haviam sido as engraçadas, ou histórias sobre mulheres mais espertas que aqueles que deveriam ser mais inteligentes que todo mundo. Ele tinha certeza de que ela havia pedido histórias sobre Lenn e Salya só para provocá-lo. Certamente ela conseguia ver que o mundo lá fora não era lugar para gente dos Dois Rios. Ouvir histórias de aventura, até mesmo sonhar com elas, era uma coisa; tê-las acontecendo à sua volta seria outra totalmente diferente.
— Histórias antigas, essas — disse Thom Merrilin, e de repente ele já estava jogando três bolas coloridas em cada mão. — Histórias da Era anterior à Era das Lendas, dizem alguns. Talvez até mais antigas. Mas eu tenho todas as histórias, vejam vocês, de Eras que foram e que ainda serão. Eras em que os homens comandavam os céus e as estrelas, e Eras em que os homens eram irmãos dos animais. Eras de maravilhas e Eras de horrores. Eras que chegaram ao fim com chuvas de fogo caindo dos céus e Eras condenadas por neve e gelo que cobriram terra e mar. Eu tenho todas as histórias e contarei todas elas. Contos de Mosk, o Gigante, com sua Lança de fogo que podia chegar ao outro lado do mundo, e suas guerras com Elsbet, a Rainha de Todos. Contos de Materese, a Curandeira, Mãe do Admirável Ind.
As bolas agora dançavam entre as mãos de Thom em dois círculos que se entrelaçavam. Sua voz era quase um cântico, e ele virou-se devagar, como se inspecionasse minuciosamente os espectadores para medir o efeito que provocava neles.
— Eu lhes contarei sobre o fim da Era das Lendas, sobre o Dragão e sua tentativa de libertar o Tenebroso no mundo dos homens. Eu lhes contarei sobre o Tempo da Loucura, quando Aes Sedai causaram a Ruptura do Mundo; sobre as Guerras dos Trollocs, quando homens combateram Trollocs pelo domínio da terra; sobre a Guerra dos Cem Anos, quando homens combateram homens, e as nações dos nossos dias foram forjadas. Eu contarei sobre as aventuras de homens e mulheres, ricos e pobres, grandes e pequenos, orgulhosos e humildes. O cerco dos Pilares do Céu. “Como a dona de casa Karil curou seu marido dos roncos.” O Rei Darith e a queda da Casa de…
O fluxo de palavras e os malabarismos pararam abruptamente. Thom simplesmente apanhou as bolas no ar e parou de falar. Sem que Rand percebesse, Moiraine havia se juntado aos espectadores. Lan estava ao lado dela, embora Rand tenha precisado olhar duas vezes para vê-lo. Por um instante Thom olhou para Moiraine de esguelha, o rosto e o corpo imobilizados, exceto pelo gesto de fazer as bolas desaparecerem nas amplas mangas de seu casaco. Então ele fez uma mesura para ela, abrindo bem o manto.
— Com seu perdão, mas você certamente não é deste distrito.
— Lady! — Ewin sibilou, feroz. — Lady Moiraine.
Thom piscou, depois voltou a se curvar, mais baixo.
— Seu perdão mais uma vez… hã, Lady. Não tive a intenção de desrespeitá-la.
Moiraine fez um breve gesto, deixando o assunto de lado.
— Não percebi nenhum desrespeito, Mestre Bardo. E meu nome é simplesmente Moiraine. Sou de fato uma estranha aqui, uma viajante como o senhor, longe de casa e só. O mundo pode ser um lugar perigoso quando se é um estranho.
— Lady Moiraine coleciona histórias — interrompeu Ewin. — Histórias sobre coisas que aconteceram nos Dois Rios. Embora eu não faça ideia do que aconteceu aqui algum dia que dê uma história.
— Acredito que você também vá gostar de minhas histórias… Moiraine. — Thom a observou com uma desconfiança óbvia. Não parecia muito satisfeito por encontrá-la ali.
Subitamente, Rand se perguntou que espécie de entretenimento poderia ser oferecido a uma dama como ela numa cidade como Baerlon, ou Caemlyn. Certamente não seria nada melhor do que um menestrel.
— É uma questão de preferência, Mestre Bardo — replicou Moiraine. — Gosto de algumas histórias. De outras, não.
A mesura de Thom foi mais intensa ainda, curvando seu corpo em paralelo ao chão.
— Eu lhe asseguro: nenhuma de minhas histórias vai desagradar. Todas agradarão e entreterão. E a senhora muito me honra. Eu sou apenas um simples menestrel; isso e nada mais.
Moiraine respondeu à mesura dele com um gracioso aceno de cabeça. Por um instante ela pareceu ainda mais a dama que Ewin havia descrito, aceitando uma oferenda de um de seus súditos. Então ela se afastou, e Lan a seguiu, um lobo atrás de um cisne deslizante. Thom ficou olhando para os dois, as grossas sobrancelhas baixas enquanto ele acariciava os longos bigodes com os nós dos dedos, até o par ter cruzado metade do Campo. Ele não está nem um pouco satisfeito, pensou Rand.
— O senhor vai fazer mais um pouco de malabarismo agora? — Ewin quis saber.
— Engula fogo! — Mat gritou. — Quero ver você comer fogo.
— Harpa! — uma voz gritou do meio da multidão. — Toque a harpa! — Mais alguém gritou pedindo a flauta.
Naquele momento a porta da estalagem foi aberta e o Conselho da Aldeia saiu, Nynaeve entre eles. Rand reparou que Padan Fain não estava junto; aparentemente o vendedor itinerante havia decidido permanecer no salão aquecido com seu vinho quente.
Resmungando sobre “um conhaque forte”, Thom Merrilin bruscamente pulou do velho alicerce. Ignorou os gritos daqueles que o estavam observando e forçou passagem em meio aos Conselheiros antes mesmo de eles terminarem de passar pela porta.
— Ele é um menestrel ou um rei? — Cenn Buie perguntou com um tom de voz aborrecido. — Um desperdício de dinheiro, se querem saber a minha opinião.
Bran al’Vere virou-se ligeiramente para olhar o menestrel, depois balançou a cabeça.
— Aquele homem pode dar mais trabalho do que ele vale.
Nynaeve, ocupada em ajeitar o manto em torno do corpo, fungou alto.
— Preocupe-se com o menestrel o quanto quiser, Brandelwyn al’Vere. Pelo menos ele está em Campo de Emond, coisa que não se pode dizer desse falso Dragão. Mas, já que você está preocupado, há outros aqui que deveriam de fato preocupá-lo.
— Se não se importa, Sabedoria — disse Bran com rigidez —, faça a gentileza de deixar que eu decido com quem me preocupo. A Senhora Moiraine e Mestre Lan são hóspedes em minha estalagem, e gente decente e respeitável, é o que digo. Nenhum dos dois me chamou de tolo na frente de todo o Conselho. Nenhum dos dois disse ao Conselho que, juntando todos os seus membros, não se faz um cérebro completo.
— Parece que minha estimativa foi até muito otimista — retorquiu Nynaeve.
Então ela se foi, sem olhar para trás, deixando Bran abrindo e fechando a boca em busca de uma resposta.
Egwene olhou para Rand como se fosse falar, mas acabou saindo em disparada atrás da Sabedoria. Rand sabia que devia haver algum jeito de impedi-la de deixar os Dois Rios, mas o único modo que lhe ocorria era um para o qual não estava preparado, mesmo que ela estivesse. E ela havia praticamente dito que não queria, o que o fez se sentir ainda pior.
— Aquela moça precisa de um marido — Cenn Buie resmungou, na ponta dos pés. Seu rosto estava arroxeado, e ficando ainda mais escuro. — Ela não tem o devido respeito. Nós somos o Conselho da Aldeia, não moleques varrendo o quintal dela, e…
O Prefeito respirou fundo e subitamente voltou-se contra o velho telhador.
— Cale-se, Cenn! Pare de agir como um Aiel de véu negro!
O homem magro ficou paralisado, surpreso. O Prefeito nunca se descontrolava, mas agora o fuzilava com os olhos.
— Que me queimem, mas temos coisas melhores para fazer do que nos preocupar com essa bobagem. Ou você pretende provar que Nynaeve tem razão? — Com isso, Bran voltou pisando forte para o interior da estalagem e bateu a porta.
Os outros membros do Conselho olharam para Cenn, depois cada um seguiu seu caminho. Todos menos Haral Luhhan, que acompanhou o telhador carrancudo, falando baixinho. O ferreiro era o único que conseguia trazer Cenn de volta à razão.
Rand foi ao encontro do pai, e seus amigos o seguiram.
— Nunca vi Mestre al’Vere tão furioso — foram as primeiras palavras de Rand, que lhe renderam um olhar de desaprovação de Mat.
— O Prefeito e a Sabedoria raramente concordam — disse Tam —, e hoje concordaram ainda menos que de costume. Foi isso. Acontece a mesma coisa em todas as aldeias.
— E quanto ao falso Dragão? — A pergunta de Mat se fez acompanhar de murmúrios ansiosos de Perrin. — E as Aes Sedai?
Tam sacudiu a cabeça devagar.
— Mestre Fain sabia pouco mais do que já havia contado. Pouco que nos interessasse, pelo menos. Batalhas ganhas ou perdidas. Cidades tomadas e retomadas. Tudo em Ghealdan, graças à Luz. A guerra não se espalhou, ou pelo menos ainda não havia se espalhado, segundo as últimas notícias que Mestre Fain teve.
— Batalhas me interessam — disse Mat.
— O que foi que ele disse sobre elas? — Perrin acrescentou.
— Batalhas não me interessam, Matrim — afirmou Tam. — Mas tenho certeza de que ele ficará feliz em lhe contar tudo sobre elas mais tarde. O que me interessa de fato é que não devemos ter de nos preocupar com elas aqui, até onde o Conselho pode dizer. Não vemos nenhum motivo para que as Aes Sedai passem por aqui a caminho do sul. E quanto à jornada de volta, não é provável que queiram atravessar a Floresta de Sombras nem nadar pelo Rio Branco.
Rand e os outros riram com a ideia. Havia três motivos pelos quais ninguém ia para os Dois Rios a não ser pelo norte, cruzando Barca do Taren. As Montanhas da Névoa, a oeste, eram o primeiro, é claro, e o Charco bloqueava o caminho pelo leste com a mesma eficiência. Ao sul ficava o Rio Branco, cujo nome se devia à maneira como as rochas e pedras agitavam as águas rápidas, transformando-as em espuma. E além do Branco ficava a Floresta de Sombras. Pouca gente dos Dois Rios já havia atravessado o Branco, e um número ainda menor havia retornado. O que todos sabiam, porém, era que a Floresta de Sombras se estendia para o sul por mais de cem milhas sem estrada nem aldeia, mas com muitos lobos e ursos.
— Então para nós é o fim — disse Mat. Ele parecia um pouco decepcionado.
— Não exatamente — comentou Tam. — Depois de amanhã vamos enviar homens para a Trilha de Deven e a Colina da Vigília, e também para Barca do Taren, para que seja organizado um sistema de vigilância. Cavaleiros ao longo do Branco e do Taren, e patrulhas entre os dois. Isso deveria ser feito hoje, mas apenas o Prefeito concorda comigo. O restante não vê a necessidade de pedir a alguém que passe o Bel Tine cavalgando pelos Dois Rios.
— Mas pensei que o senhor tivesse dito que não tínhamos de nos preocupar — disse Perrin.
Tam balançou a cabeça.
— Eu disse que não deveríamos, rapaz, não que não nos preocupamos. Já vi homens morrerem porque tinham certeza de que o que não deveria acontecer não aconteceria. Além disso, a luta vai agitar todo tipo de gente. A maioria só vai tentar encontrar um lugar seguro, mas outros vão procurar um jeito de lucrar com a confusão. Vamos oferecer ajuda aos primeiros, mas precisamos estar prontos para despachar o segundo tipo.
Abruptamente Mat falou:
— Podemos participar? Eu quero, pelo menos. O senhor sabe que sei cavalgar tão bem quanto qualquer um na aldeia.
— Você quer algumas semanas de frio, tédio e camas desconfortáveis? — Tam riu. — Porque provavelmente é tudo que vai ter. É o que eu espero. Estamos fora do caminho até mesmo para refugiados. Mas pode falar com Mestre al’Vere, se estiver realmente decidido. Rand, está na hora de voltarmos à fazenda.
Rand piscou, surpreso.
— Achei que íamos ficar para a Noite Invernal.
— Há trabalho a fazer na fazenda, e preciso de você lá comigo.
— Mesmo assim, poderíamos ficar aqui mais algumas horas. E eu também quero me oferecer como voluntário para as patrulhas.
— Nós vamos agora — o pai replicou num tom de voz que não admitia discussões. E com um tom mais suave acrescentou: — Amanhã voltaremos com tempo de sobra para você falar com o Prefeito. E com tempo de sobra para o Festival também. Agora você tem cinco minutos. Depois me encontre no estábulo.
— Você vai se juntar a Rand e a mim na vigilância? — Mat perguntou a Perrin quando Tam se afastou. — Aposto que nada parecido jamais aconteceu nos Dois Rios. Ora, se chegarmos ao Taren, pode até ser que vejamos soldados, ou sabe-se lá o quê. Talvez até Latoeiros.
— Eu espero que sim — Perrin disse devagar —, se Mestre Luhhan não precisar de mim, quer dizer.
— A guerra é em Ghealdan — retrucou Rand. Com esforço, ele abaixou a voz. — A guerra é em Ghealdan, e só a Luz sabe onde as Aes Sedai estão, mas nenhuma delas está aqui. O homem do manto preto está, ou vocês já esqueceram dele?
Os outros trocaram olhares envergonhados.
— Desculpe, Rand — resmungou Mat. — Mas uma oportunidade de fazer alguma coisa além de ordenhar as vacas do meu pai não aparece com muita frequência. — Ele endireitou os ombros sob os olhares espantados deles. — Bem, eu as ordenho mesmo, e todos os dias.
— O cavaleiro negro — Rand lembrou. — E se ele machucar alguém?
— Talvez ele seja um refugiado da guerra — Perrin disse, em tom de dúvida.
— Seja lá o que for — disse Mat —, a guarda vai encontrá-lo.
— Talvez — retrucou Rand —, mas ele parece desaparecer quando quer. Talvez fosse melhor se soubessem que deviam procurá-lo.
— Vamos contar a Mestre al’Vere quando nos apresentarmos como voluntários para as patrulhas — disse Mat. — Depois ele conta ao Conselho, e eles à guarda.
— O Conselho! — exclamou Perrin, incrédulo. — Teríamos sorte se o Prefeito não risse na nossa cara. Mestre Luhhan e o pai de Rand já acham que nós dois estamos com medo de sombras.
Rand suspirou.
— Se vamos fazer isso, então é melhor fazer agora. Ele não vai rir mais alto hoje que amanhã.
— Talvez — disse Perrin, olhando de soslaio para Mat — devêssemos tentar encontrar outras pessoas que o viram. Vamos ver praticamente todo mundo na aldeia esta noite.
A cara de Mat fechou-se ainda mais. Ele, porém, não disse nada. Todos entenderam que Perrin queria dizer que deveriam encontrar testemunhas que fossem mais confiáveis que Mat.
— Ele não vai rir mais alto amanhã — acrescentou Perrin quando Rand hesitou. — E eu preferia ter mais alguém conosco quando formos falar com ele. Metade da aldeia estaria bom para mim.
Rand assentiu devagar. Ele já podia ouvir Mestre al’Vere rindo. Mais testemunhas certamente não poderiam fazer mal. E se três deles haviam visto o sujeito, então outras pessoas deviam tê-lo visto também. Precisavam ter visto.
— Amanhã, então. Vocês dois encontrem quem puderem esta noite, e amanhã iremos até o Prefeito. Depois disso…
Olharam para ele em silêncio, ninguém dando voz à pergunta do que aconteceria se não conseguissem encontrar mais alguém que tivesse visto o homem do manto negro. Mas o questionamento estava claro nos olhos deles, e Rand não tinha resposta. Ele suspirou profundamente.
— É melhor eu ir agora. Meu pai deve estar se perguntando se caí em um buraco.
Acompanhado pelas despedidas dos outros dois, Rand seguiu apressado até o estábulo onde a carroça de rodas altas estava apoiada nos varais.
O estábulo era uma construção comprida e estreita, encimada por um telhado de palha alto e pontudo. As baias, com o chão coberto de palha, ocupavam ambos os lados da penumbra do interior, iluminado somente pelas portas duplas abertas nas duas extremidades. Os cavalos do mascate comiam aveia em oito baias, e os imensos Dhurrans de Mestre al’Vere, os animais que ele alugava quando os fazendeiros tinham trabalho demais para seus próprios cavalos, enchiam mais seis, mas somente três outras estavam ocupadas. Rand percebeu que podia associar cada cavalo com seu cavaleiro facilmente. O garanhão negro, alto, de peito largo, que balançava a cabeça ferozmente, só podia ser de Lan. A égua branca esguia com pescoço arqueado, os passos rápidos tão graciosos quanto os de uma garota dançando, mesmo dentro da baia, só podia pertencer a Moiraine. E o terceiro cavalo desconhecido, um cavalo castrado alto e magricela, de um marrom poeirento, combinava perfeitamente com Thom Merrilin.
Tam encontrava-se nos fundos do estábulo, segurando Bela por uma corda e conversando baixinho com Hu e Tad. Antes que Rand tivesse dado dois passos dentro do estábulo, o pai acenou com a cabeça para os cavalariços e conduziu Bela para fora, juntando-se a Rand no caminho sem dizer uma palavra.
Eles puseram os arreios na égua peluda em silêncio. Tam parecia estar tão perdido em seus pensamentos que Rand segurou a língua. Não estava lá muito animado para tentar convencer o pai, e muito menos o Prefeito, a respeito do cavaleiro negro. No dia seguinte deveria haver tempo suficiente, quando Mat e o restante tivessem encontrado outros que houvessem visto o homem. Se encontrassem.
Quando a carroça começou a andar, Rand pegou o arco e a aljava na traseira, prendendo, meio atrapalhado, a aljava na cintura enquanto quase corria ao lado dela. Quando chegaram à última fileira de casas da aldeia, ele encaixou uma flecha no arco, carregando-a um pouco levantada e parcialmente puxada. Não havia nada para ver exceto árvores, em sua maior parte desfolhadas, mas os ombros dele se retesaram. O cavaleiro negro poderia surgir em cima deles antes que qualquer um dos dois percebesse. Poderia não haver tempo para puxar o arco se ele já não o tivesse quase pronto.
Rand sabia que não podia manter a tensão na corda do arco por muito tempo. Ele próprio o havia construído, e Tam era um dos poucos no distrito que conseguia puxá-lo todo até o rosto. Olhou ao redor, em busca de alguma coisa para afastar sua mente do cavaleiro negro. Cercados pela floresta, com seus mantos ondulando ao vento, isso não era fácil.
— Pai — disse finalmente —, não entendo por que o Conselho precisou interrogar Padan Fain. — Com esforço, ele desviou a atenção da floresta e olhou para Tam por cima de Bela. — Parece-me que a decisão a que vocês chegaram poderia ter sido tomada na hora. O Prefeito assustou todo mundo falando de Aes Sedai e do falso Dragão aqui nos Dois Rios.
— As pessoas são engraçadas, Rand. As melhores são assim. Haral Luhhan, por exemplo. Mestre Luhhan é um homem forte e corajoso, mas não consegue ver um açougueiro em ação. Fica branco feito um lençol.
— O que isso tem a ver com o que estamos falando? Todo mundo sabe que Mestre Luhhan não aguenta ver sangue, e ninguém, a não ser os Coplins e os Congars, vê problema nisso.
— É exatamente isso, rapaz. As pessoas nem sempre pensam ou se comportam da maneira que você espera. Aquela gente na aldeia… Se o granizo arrasar suas plantações, o vento levar cada telhado deles e os lobos matarem metade de suas ovelhas, eles vão arregaçar as mangas e começar do zero. Vão se lamentar, mas não perderão tempo. Mas é só você fazê-los pensar em Aes Sedai e em um falso Dragão em Ghealdan, e num instante eles começam a pensar que Ghealdan não é tão longe assim, do outro lado da Floresta de Sombras, e que uma linha reta de Tar Valon a Ghealdan não passaria tão longe a leste. Como se as Aes Sedai não fossem pegar a estrada por Caemlyn e Lugard, em vez de seguir pelo meio do nada! Amanhã pela manhã metade da aldeia já teria certeza de que a guerra estava prestes a se abater sobre nós. Essa confusão levaria semanas para ser desfeita. Um belo Bel Tine isso daria. Então Bran lhes deu a ideia antes que eles pudessem tê-la por conta própria.
“Eles viram o Conselho levar o problema em consideração, e a esta altura estarão ouvindo o que decidimos. Eles nos escolheram para o Conselho da Aldeia porque confiam que possamos pensar nas coisas da melhor maneira para todos. Eles confiam em nossas opiniões. Até mesmo na de Cenn, o que não diz muita coisa em nosso favor, suponho. De qualquer maneira, eles ouvirão que não há nada com que se preocupar, e vão acreditar. Não é que eles não pudessem chegar à mesma conclusão, ou não acabassem chegando a ela em algum momento, mas desse jeito o Festival não será arruinado, e ninguém terá de passar semanas se preocupando com uma coisa que provavelmente não acontecerá. Se acontecer, contra todas as probabilidades… bem, as patrulhas nos darão aviso com tempo suficiente para fazermos o que pudermos. Mas realmente acho que a coisa não vai chegar a esse ponto.”
Rand estufou as bochechas. Aparentemente, fazer parte do Conselho era mais complicado do que ele pensava. A carroça rodava barulhenta pela Estrada da Pedreira.
— Alguém além de Perrin viu esse cavaleiro estranho? — Tam perguntou.
— Mat viu, mas… — Rand piscou, depois olhou de volta para o pai por cima de Bela.
— O senhor acredita em mim? Então tenho de voltar. Tenho de contar a eles. — O grito de Tam o deteve quando ele se virou para voltar correndo para a aldeia.
— Calma, rapaz, calma! Você acha que esperei até agora para falar sem nenhum motivo?
Com relutância, Rand permaneceu ao lado da carroça ainda rangendo atrás da paciente Bela.
— O que fez o senhor mudar de ideia? Por que não posso avisar os outros?
— Eles vão saber em breve. Perrin, pelo menos, saberá. Quanto a Mat, não tenho certeza. A notícia tem de ser levada para as fazendas da melhor maneira possível, mas daqui a mais uma hora não haverá ninguém em Campo de Emond acima de dezesseis anos, pelo menos os responsáveis, que não saiba que um estranho anda espreitando por aí, e que provavelmente não é o tipo que você convidaria para o Festival. O inverno já está sendo ruim o bastante sem isso para assustar os mais jovens.
— Festival? — perguntou Rand. — Se o senhor o tivesse visto, não ia querer vê-lo nem a dez milhas de distância. Talvez nem a cem.
— Talvez — disse Tam placidamente. — Ele poderia ser apenas um refugiado dos problemas em Ghealdan, ou mais provavelmente um ladrão que pensa que vai ser mais fácil fazer um ganho aqui do que em Baerlon ou Barca do Taren. Mesmo assim, ninguém aqui por perto possui o suficiente para se dar ao luxo de ter suas posses roubadas. Se o homem estiver tentando fugir da guerra… bem, ainda assim isso não é desculpa para assustar as pessoas. Quando a guarda for montada, vai encontrá-lo ou afugentá-lo daqui.
— Espero que ela o afugente. Mas por que acredita em mim agora, se não acreditou hoje de manhã?
— Naquele momento, eu tinha de acreditar nos meus próprios olhos, rapaz, e eu não vi nada. — Tam sacudiu a cabeça grisalha. — Só jovens veem esse sujeito, ao que parece. Quando Haral Luhhan mencionou que Perrin estava se assustando com sombras, a questão veio à tona. O filho mais velho de Jon Thane também o viu, assim como o garoto de Samel Crawe, Bandry. Bem, quando quatro de vocês dizem que viram uma coisa… e todos rapazes sérios… começamos a pensar que talvez a coisa esteja ali, quer sejamos capazes de vê-la ou não. Todos menos Cenn, é claro. De qualquer maneira, é por isso que estamos indo para casa. Com nós dois longe, esse estranho poderia estar aprontando qualquer coisa por lá. Se não fosse pelo Festival, eu não voltaria nem amanhã. Mas não podemos nos tornar prisioneiros em nossa própria casa só porque esse sujeito está à espreita.
— Eu não sabia de Ban nem de Lem — disse Rand. — O restante de nós ia ao Prefeito amanhã, mas estávamos preocupados com a possibilidade de que ele também não acreditasse.
— Termos cabelos grisalhos não significa que nossos cérebros tenham virado coalhada — disse Tam, seco. — Então fique de olhos abertos. Talvez eu também o veja se ele aparecer novamente.
Rand então dedicou-se justamente a isso. E ficou surpreso ao perceber que seus passos pareciam mais leves. Os nós haviam desaparecido de seus ombros. Ele ainda estava assustado, mas não tanto quanto antes. Tam e ele estavam tão sós na Estrada da Pedreira quanto naquela manhã, mas de certa maneira ele tinha a sensação de que toda a aldeia estava com eles. O fato de outros saberem e acreditarem fazia toda a diferença. Não havia nada que o cavaleiro de negro pudesse fazer que o povo de Campo de Emond, unido, não fosse capaz de enfrentar.