CAPÍTULO VI Palimpsesto

E se os Guardiões não estão felizes, quem mais pode estar?

ARISTÓTELES. A Política Livro 2, capítulo 5

Quando o avião atingiu a altitude de cruzeiro, com Albuquerque já mais de cem milhas atrás deles, Ellie olhou distraidamente para o pequeno retângulo de cartão branco com letras azuis que fora grampeado ao sobrescrito do seu bilhete de avião. Dizia, numa linguagem que não mudara desde o seu primeiro vôo comercial: «isto não é o talão de bagagem descrito pelo artigo 4. O da Convenção de Varsóvia.» Por que estavam as companhias de aviação tão preocupadas, perguntou-se, com a possibilidade de os passageiros poderem confundir aquele bocado de cartão com o talão de bagagem da Convenção de Varsóvia? Por que motivo nunca vira ela nenhum? Onde os tinham armazenados? Nalgum esquecido acontecimento-chave da história da aviação, uma desatenta companhia de aviação devia ter-se esquecido de imprimir aquele aviso em retângulos de cartão e sido processada, até à falência, por passageiros irados que haviam sido induzidos no equívoco de que aquele era o talão de bagagem de Varsóvia. Havia sem dúvida fortes razões financeiras para aquela preocupação à escala mundial — razões nunca de outro modo expressas — quanto a que bocados de cartão não são descritos pela Convenção de Varsóvia. Imaginem, pensou, todas estas linhas impressas dedicadas, em vez de a este assunto, a qualquer coisa útil — a história da exploração do mundo por exemplo, ou fatos científicos incidentais, ou mesmo o número médio de milhas-passageiro até o avião em que uma pessoa viajava se despenhar.

Se tivesse aceitado a oferta de Der Heer de um avião militar, naquele momento estaria a formar outras associações casuais. Mas isso teria sido excessivamente cômodo, talvez alguma abertura que conduzisse a uma eventual militarização do projeto. Tinham preferido viajar de avião comercial. Os olhos de Valerian já estavam fechados quando ele acabou de se instalar no lugar ao lado dela. Não houvera nenhuma pressa especial, nem mesmo depois de resolvidos os pormenores de última hora sobre a análise de dados, com a sugestão de que a segunda pele da cebola estava prestes a soltar-se. Tinham conseguido lugar num avião comercial que chegaria a Washington muito antes da reunião do dia seguinte, na realidade com tempo suficiente para uma boa noite de sono.

Ellie olhou para o sistema telefax, bem acondicionado numa maleta de cabedal com fecho de correr colocada debaixo do lugar à sua frente. Era várias centenas de kilobits por segundo mais rápido do que o antigo modelo de Peter e produzia gráficos muito melhores. Bem, talvez no dia seguinte tivesse de o utilizar para explicar à presidente dos Estados Unidos da América o que Adolf Hitler estava a fazer em Vega. Sentia-se, teve de admitir intimamente, um pouco nervosa quanto ao encontro. Nunca se encontrara antes com um presidente, e, pelos padrões dos fins do século XX, esta não era muito má. Não tivera tempo para arranjar o cabelo e muito menos para um tratamento especial. Ora, não ia à Casa Branca para olharem para ela.

Que pensaria o seu padrasto? Ainda estaria convencido de que ela não tinha condições para ser cientista? Ou a sua mãe, agora confinada a uma cadeira de rodas numa casa de saúde? Conseguira apenas fazer um telefonema breve à mãe desde a descoberta, havia uma semana, e prometeu a si mesma voltar a telefonar no dia seguinte.

Como já fizera cem vezes antes, espreitou pela janela do avião e imaginou que impressão causaria a Terra a um observador extraterrestre, àquela altitude de cruzeiro de doze ou catorze quilômetros, e presumindo que o alienígena tinha olhos mais ou menos como os nossos. Havia vastas áreas do Médio Oeste complicadamente geometrizadas com quadrados, retângulos e círculos por aqueles que tinham predileções agrárias ou urbanas; e, como ali, vastas áreas do Sudoeste nas quais o único sinal de vida inteligente era uma linha reta ocasional avançando entre montanhas e através de desertos. Seriam os mundos de civilizações mais avançadas totalmente geometrizados, inteiramente reconstruídos pelos seus habitantes? Ou a assinatura de uma civilização realmente avançada seria não deixar absolutamente nenhum sinal? Seriam capazes de dizer, com um olhar rápido, precisamente em que estádio nos encontrávamos numa grande seqüência evolutiva cósmica do desenvolvimento de seres inteligentes?

Que mais poderiam dizer? Pelo azul do céu podiam fazer um cálculo aproximado do número de Loschmidt, quantas moléculas havia em um centímetro cúbico ao nível do mar. Cerca de três vezes dez elevado a dezenove. Podiam calcular facilmente as altitudes das nuvens pelo comprimento das suas sombras no céu. Se sabiam que as nuvens eram água condensada, podiam calcular aproximadamente a proporção de declínio da atmosfera, porque a temperatura tinha de descer para cerca de -40ºC nas altitudes das nuvens mais altas que ela conseguia ver. A erosão de formas de terra, os padrões dendróides e em paus de canga de rios, a presença de lagos e desgastados tampões vulcânicos, tudo falava de uma antiga batalha entre processos de terra-formação e erosivos. Na realidade, percebia-se com uma vista de olhos que este era um planeta antigo com uma civilização novinha em folha.

Na sua maioria, os planetas da galáxia deviam ser veneráveis e pré-técnicos, talvez até sem vida. Uns poucos abrigariam civilizações muito mais antigas do que as nossas. Mundos com civilizações técnicas a começar apenas a emergir deviam ser espetacularmente raros. Era talvez a única qualidade fundamentalmente ímpar a respeito da Terra.

Durante o almoço, a paisagem tornou-se lentamente verdejante, à medida que se aproximavam do vale do Mississipi. Não havia quase nenhuma sensação de movimento na vida aérea moderna, pensou Ellie. Olhou para o corpo ainda adormecido de Peter, que recusara com alguma indignação a perspectiva de um almoço de companhia de aviação. A seguir a ele, do outro lado da coxia, encontrava-se um ser humano muito jovem, talvez com três meses de idade, confortavelmente aninhado nos braços do pai. Qual seria a visão de um bebê de uma viagem aérea? Vamos a um lugar especial, entramos numa sala muito grande e sentamo-nos. A sala faz um barulho surdo e contínuo e estremece durante quatro horas. Depois levantamo-nos e saímos. Magicamente, estamos noutro lugar qualquer. O meio de transporte parece obscuro, mas a idéia básica é fácil de apreender e não é necessário o domínio precoce das equações Navier-Stokes.

Ao fim da tarde sobrevoaram Washington a aguardar autorização para aterrar. Ela conseguiu distinguir, entre o Monumento a Washington e o Memorial a Lincoln, uma grande multidão de gente. Era, segundo lera havia apenas uma hora no telefax do Times, uma concentração maciça de negros americanos protestando contra disparidades econômicas e injustiças educacionais. Considerando a justiça das suas reclamações, pensou Ellie, tinham sido muito pacientes. Perguntou a si mesma como reagiria a presidente à concentração e à transmissão de Vega, acerca de ambas as quais teriam de ser feitos no dia seguinte alguns comentários públicos oficiais.


— Que quer dizer, Ken, com «eles saem»?

— Quero dizer, senhora Presidente, que os nossos sinais de televisão deixam este planeta e saem para o espaço.

— Exatamente até onde vão?

— Com todo o devido respeito, senhora Presidente, as coisas não funcionam desse modo.

— Bem, então como funcionam?

— Os sinais irradiam da Terra em ondas esféricas, um pouco como a ondulação numa lagoa. Viajam à velocidade da luz — cento e oitenta e seis mil milhas por segundo — e essencialmente propagam-se infinitamente. Quanto melhores forem os receptores de qualquer outra civilização, tanto mais distantes podem estar e mesmo assim captar os nossos sinais TV. Até nós podíamos captar uma forte transmissão TV de um planeta a deslocar-se à volta da estrela mais próxima.

Durante um momento, a presidente ficou ereta e rígida, a olhar, pelas portas-janelas, para o Jardim das Rosas. Depois voltou-se para Der Heer:

— Quer dizer… tudo?

— Sim, tudo.

— Pretende mesmo dizer toda aquela bagunça da televisão? Os choques de automóveis? A luta? Os canais pornô? O telejornal a noite?

— Tudo, senhora Presidente. — Der Heer abanou a cabeça, numa consternação compassiva.

— Der Heer, estou a compreendê-lo corretamente? Quer dizer que todas as minhas conferências de imprensa, os meus debates, o meu discurso de tomada de posse, está tudo lá fora?

— Essa é a boa notícia, senhora Presidente. A má notícia é que também estão todas as aparições na televisão do seu antecessor. E Dick Nixon. E os dirigentes soviéticos. Assim como uma quantidade de coisas desagradáveis que o seu adversário disse a seu respeito. É uma bênção mista.

— Meu Deus! Está bem, prossiga. — A presidente afastara-se das portas-janelas e estava agora aparentemente ocupada a examinar um busto de mármore de Tom Paine, recentemente recuperado da cave do Smithsonian Institution, para onde fora relegado pelo presidente anterior.

— Encare o assunto deste modo: aqueles poucos minutos de televisão vindos de Vega foram primitivamente emitidos em 1936, na inauguração dos Jogos Olímpicos em Berlim. Embora tivessem sido apenas mostrados na Alemanha, foi a primeira transmissão televisiva efetuada na Terra com potência moderada. Ao contrário da radiotransmissão corrente dos anos trinta, aqueles sinais TV atravessaram a nossa ionosfera e alastraram para o espaço. Estamos a tentar descobrir exatamente o que foi então retransmitido, mas isso levará provavelmente algum tempo. Talvez aquelas boas-vindas de Hitler sejam o único fragmento de transmissão que eles foram capazes de captar em Vega.

«Assim, do ponto de vista deles, Hitler é o primeiro sinal de vida inteligente na Terra. Não estou a tentar ser sarcástico. Eles não sabem o que a transmissão significa e, por isso, gravam-na e retransmitem-na para nós. É uma maneira de dizer «Olá, ouvimo-los». Parece-me um gesto muito amigável.

— Quer então dizer que não houve nenhuma transmissão de televisão anterior ao pós-Segunda Guerra Mundial?

— Nada significativo. Houve uma transmissão local em Inglaterra, na coroação de Jorge VI, algumas coisas desse gênero. A transmissão de televisão em grande começou no fim dos anos quarenta. Todos esses programas estão a deixar a Terra à velocidade da luz. Imagine que a Terra é aqui — Der Heer fez um gesto no ar — e há uma pequena onda esférica a afastar-se dela à velocidade da luz a partir de 1936. Mantém-se a expandir-se e a afastar-se da Terra. Mais cedo ou mais tarde chega à civilização mais próxima. Esta parece estar surpreendentemente perto, apenas a vinte e seis anos-luz de distância, nalgum planeta da estrela Vega. Eles gravam-na e retransmitem-na para nós. Mas são precisos outros vinte e seis anos para os Jogos Olímpicos de Berlim regressarem à Terra. Conseqüentemente, os Veganianos não precisaram de décadas para compreender o que se passava. Deviam estar muito bem sintonizados, todos a postos, prontos para avançar, à espera dos nossos primeiros sinais de televisão. Detectaram-nos, gravaram-nos e, passado algum tempo, devolveram-no-los. Mas, a não ser que já cá tivessem estado — alguma missão de exploração há cem anos, compreende? — , não podiam ter sabido que estávamos prestes a inventar a televisão. Por isso, a doutora Arroway pensa que esta civilização está a monitorizar todos os sistemas planetários próximos, para ver se alguns dos seus vizinhos desenvolve alta tecnologia.

— Ken, há aqui uma quantidade de coisas em que é preciso pensar. Tem a certeza de que esses… — como lhes chamou, Veganianos? — … tem a certeza de que eles não compreendem a respeito do que era esse programa de televisão?

— Senhora Presidente, não há dúvida nenhuma de que são inteligentes. Aquele sinal de 1936 era muito fraco. Os seus detectores têm de ser fantasticamente sensíveis para terem conseguido captá-lo. Mas não vejo como poderiam ter compreendido o que significa. Provavelmente têm um aspecto muito diferente do nosso. Devem ter história diferente e diferentes costumes. Não existe nenhuma maneira possível de saberem o que é uma suástica ou quem foi Adolf Hitler.

— Adolf Hitler! Ken, isso deixa-me furiosa! Morrem quarenta milhões de pessoas para derrotar esse megalomaníaco, e ele é a estrela da primeira transmissão para outra civilização? Ele está a representar-nos. E a eles. o sonho mais desvairado desse louco tornado realidade.

Fez uma pausa e continuou em voz mais calma:

— Sabe, nunca achei que Hitler soubesse fazer aquela saudação hitleriana. Nunca saía direita, desviava-se sempre para algum ângulo excêntrico. E depois havia aquela saudação maluca de cotovelo dobrado. Se alguém tivesse feito os seus heil hitlers tão incompetentemente, teria sido mandado para a frente russa.

— Mas não há uma diferença? Ele estava apenas a retribuir as saudações dos outros. Não estava a saudar Hitler.

— Oh, estava, sim! — replicou a presidente, que, com um gesto, dirigiu Der Heer para fora da Sala Rosa e por um corredor fora. De súbito parou e olhou para o seu conselheiro científico. — E se os nazis não tivessem tido televisão em 1936? Que teria acontecido?

— Bem, nesse caso suponho que poderia ter sido a coroação de Jorge VI, ou uma das transmissões acerca da Feira Mundial de Nova Iorque de 1939, se alguma delas tivesse sido suficientemente potente para ser recebida em Vega. Ou alguns programas dos fins dos anos quarenta, princípios dos cinqüenta. Sabe a que me refiro, Howdy Doody, Milton Berle e as audiências Exército-McCarchy… todos esses maravilhosos sinais de vida inteligente na Terra.

— Esses malditos programas são os nossos embaixadores no espaço… o emissário da Terra. — Fez uma pausa, a saborear a frase. — Com um embaixador devemos apresentar a nossa melhor faceta, e há quarenta anos que nós estamos a enviar principalmente porcaria para o espaço. Gostaria de ver os executivos das cadeias de televisão desenrascarem-se com esta. E quanto àquele maluco do Hitler, foi essa a primeira notícia que receberam da Terra? Que vão pensar de nós?

Quando Der Heer e a presidente entraram na sala do Gabinete, os que tinham estado de pé em pequenos grupos calaram-se e alguns que estavam sentados fizeram menção de se levantar. Com um gesto natural, a presidente manifestou a sua preferência pela informalidade e, despreocupadamente, cumprimentou o secretário de Estado e um secretário da Defesa adjunto. Percorreu o grupo com uma volta lenta e deliberada da cabeça. Alguns retribuíram-lhe o olhar, na expectativa. Outros, detectando uma expressão de pequena irritação no rosto da presidente, desviaram os olhos.

— Ken, essa sua astrônoma não está aqui? Arrowsmith? Arrowroot?

— Arroway, senhora Presidente. Ela e o doutor Valerian chegaram a noite passada. Talvez o trânsito os tenha atrasado.

— A doutora Arroway telefonou do seu hotel, senhora Presidente — informou um homem novo, meticulosamente vestido. — Disse que estavam a chegar alguns dados novos através do seu telefax e que queria trazê-los para esta reunião. Devemos começar sem ela.

Michael Kitz inclinou-se para a frente e perguntou, num tom de voz e com uma expressão de incredulidade:

— Estão a transmitir dados novos sobre este assunto através de um telefone normal, inseguro, num quarto de hotel de Washington?

Der Heer respondeu tão suavemente que Kitz teve de se inclinar ainda mais para a frente para o ouvir:

— Mike, acho que há pelo menos codificação comercial no telefax dela. Lembre-se, no entanto, de que não estão estabelecidas nenhumas linhas de orientação para este assunto. Tenho a certeza de que a doutora Arroway se mostrará cooperante se tais linhas forem estabelecidas.

— Muito bem, comecemos — disse a presidente. — Esta é uma reunião informal conjunta do National Security Council e do que, por enquanto, chamamos Grupo de Trabalho de Contingência Especial. Desejo frisar a todos que nada do que for dito nesta sala — repito, nada — deverá ser discutido seja com quem for que não esteja aqui, excetuando o secretário da Defesa e o vice-presidente, que se encontram no estrangeiro. Ontem, o doutor Der Heer pôs a maior parte dos senhores ao corrente deste incrível programa de televisão da estrela Vega. É opinião do doutor Der Heer e de outros — olhou à volta da mesa — que foi apenas uma casualidade o fato de o primeiro programa de televisão a chegar a Vega ter tido como estrela Adolf Hitler. Mas é… um embaraço. Pedi ao diretor da Central Intelligence que preparasse uma avaliação de quaisquer implicações de segurança nacional em tudo isto. Há alguma ameaça direta de quem diabo está a enviar isto? Vamos ficar em apuros se houver alguma nova mensagem e algum outro país a decifrar primeiro? Mas, antes de mais nada, deixe-me perguntar-lhe, Marvin, se isto tem alguma coisa a ver com discos voadores.

O diretor da Central Intelligence, um homem autoritário no fim da meia-idade, de óculos de aros de aço, resumiu: objetos voadores não identificados, conhecidos por OVNis, tinham sido uma preocupação intermitente para a CIA e a Força Aérea, especialmente nos anos cinqüenta e sessenta, em parte por boatos a respeito deles poderem constituir um meio e uma potência hostil espalhar a confusão ou sobrecarregar os canais de comunicação. Verificou-se que alguns dos incidentes representados por meios mais dignos de crédito foram, na realidade, penetrações do espaço aéreo dos EUA ou sobrevôos de bases norte-americanas no estrangeiro por aeronaves de alta performance da União Soviética ou de Cuba. Tais sobrevôos são um meio comum de testar o estado de prontidão de um adversário potencial, e os Estados Unidos da América tinham efetuado mais do que o seu justo quinhão de penetrações, e simulações de penetração, do espaço aéreo soviético. Um Mig cubano que penetrasse duzentos milhas acima da baía do Mississipi antes de ser detectado era considerado publicidade indesejável pelo NORAD. O procedimento rotineiro da Força Aérea tinha sido negar que alguns dos seus aparelhos tivessem estado nas imediações do lugar onde o OVNI fora avistado e não dizer nada acerca de penetrações não autorizadas, solidificando assim a mistificação do público. Ao ouvir estas explicações, o chefe do Estado-Maior da Força Aérea pareceu marginalmente embaraçado, mas não disse nada.

A grande maioria dos OVNis reportados, continuou o D.C.I, era constituída por objetos naturais mal identificados pelo observador. Aeronaves não convencionais ou experimentais, faróis de automóveis refletidos de céu nublado, balões, aves, insetos luminescentes e até planetas e estrelas vistos em condições atmosféricas fora do vulgar, todas essas coisas tinham sido reportadas como OVNIs. Verificou-se que um número significativo de informações se devia a brincadeiras ou a genuínas ilusões psiquiátricas. Tinham sido comunicados mais de um milhão de avistamentos de OVNIs em todo o mundo desde que a expressão «disco voador» fora inventada, no fim dos anos quarenta, e nenhum deles parecia revestir-se de boas provas que permitissem relacioná-lo com uma visita extraterrestre. Mas a idéia engendrava emoções fortes e havia grupos e publicações marginais, e até alguns cientistas acadêmicos, que mantinham viva a suposta relação entre OVNIs e vida noutros mundos. Recente doutrina quiliasta incluía a sua parte de redentores extraterrestres que viriam em discos voadores. A investigação oficial da Força Aérea, chamada, numa das suas últimas encarnações, Projeto Livro Azul, tinha sido encerrada nos anos sessenta por falta de progresso, embora tivesse sido mantido um interesse continuado, a um nível menos elevado, conjuntamente pela Força Aérea e pela CIA. A comunidade científica estava tão convencida de que não havia nada no caso que, quando Jimmy Carter pedira à National Aeronautics and Space Administration que procedesse a um estudo amplo dos OVNIs, a NASA, contra o que era habitual, recusara um pedido presidencial.

— Na verdade — interveio um dos cientistas sentados à mesa, desconhecedor do protocolo em reuniões daquela natureza —, a história dos OVNIs tornou mais difícil fazer um trabalho sério na SETI.

— Muito bem — suspirou a presidente. — Há alguém à volta desta mesa que pense que os OVNIs e este sinal de Vega têm alguma coisa a ver entre si?

Der Heer olhou atentamente para as unhas. Ninguém falou.

— De qualquer maneira, vai haver uma enorme quantidade de eu-bem-lhes-disse da parte dos taradinhos dos OVNIs. Marvin, porque não continua?

— Em 1936, senhora Presidente, um sinal de televisão muito fraco transmite as cerimônias de inauguração dos Jogos Olímpicos a um punhado de receptores de televisão na área de Berlim. É uma tentativa para um golpe de relações públicas. Demonstra o progresso e a superioridade da tecnologia alemã. Houvera anteriormente algumas transmissões de televisão, mas todas em níveis de potência muito baixos. Na realidade, nós fizemo-lo antes dos Alemães. O secretário do Comércio, Herben Hoover, fez um breve aparecimento na televisão em… 27 de Abril de 1929. Seja como for, o sinal alemão deixa a Terra à velocidade da luz e vinte e seis anos depois chega a Vega. Eles — quem quer que «eles» sejam — conservam o sinal durante alguns anos e por fim reenviam-no-lo imensamente amplificado. A sua capacidade de receber o sinal inicial muito fraco é impressionante, como o é a sua capacidade de o devolver a níveis de potência tão elevados. Aqui há, com certeza, implicações de segurança. A comunidade de inteligência eletrônica, por exemplo, gostaria de saber como podem ser detectados sinais tão fracos. Essa gente de Vega, ou o que quer que sejam, está sem dúvida mais avançada do que nós — talvez apenas algumas décadas à nossa frente, mas também é possível que seja muito mais do que isso.

«Não nos deram nenhuma outra informação a seu respeito — a não ser o fato de, em algumas freqüências, o sinal transmitido não apresentar o efeito de Doppler resultante do movimento do seu planeta à volta da sua estrela. Simplificaram para nós esse passo de redução de dados. São… prestáveis. Até agora não foi recebido nada de interesse militar ou qualquer outro. Tudo quanto têm estado a dizer é que são bons em radioastronomia, gostam de números primos e são capazes de nos devolver as nossas primeiras transmissões de TV. Não faria mal nenhum qualquer outra nação saber isso. E lembrem-se: todos aqueles outros países estão a receber repetidamente aquela passagem de três minutos de Hitler. Simplesmente, ainda não conseguiram descobrir como lê-la. Os Russos, ou os Alemães, ou quaisquer outros, são capazes de chegar a essa modulação de polarização mais cedo ou mais tarde. A minha impressão pessoal, senhora Presidente — não sei se o secretário de Estado concorda —, é que seria melhor se a comunicássemos ao mundo antes de sermos acusados de estar a encobrir alguma coisa. Se a situação permanecer estática — sem nenhuma grande mudança no ponto em que estamos agora —, podemos pensar em fazer uma comunicação pública ou mesmo em distribuir o clip de filme de três minutos.

«Diga-se, a propósito, que não conseguimos encontrar nenhum registro dos arquivos alemães do que estava naquela transmissão primitiva. Não podemos ter a certeza absoluta de que a gente de Vega não efetuou alguma modificação no conteúdo antes de no-la reenviar. Podemos reconhecer Hitler, sem dúvida, e a parte do estádio olímpico que vemos corresponde exatamente a Berlim em 1936. Mas não temos nenhuma maneira de saber se, naquele momento, Hitler estava realmente a coçar o bigode ou a sorrir, como mostram na transmissão.

Ellie chegou ligeiramente ofegante, seguida por Valerian. Tentaram ocupar cadeiras afastadas, encostadas à parede, mas Der Heer reparou e chamou a atenção da presidente para eles.

— Doutora Arow… Arroway? Apraz-me que tenha chegado sem problemas. Primeiro deixe-me felicitá-la pela sua esplêndida descoberta. Esplêndida. Hum, Marvin…

— Cheguei a um ponto final, senhora Presidente.

— Ótimo. Doutora Arroway, sabemos que tem uma novidade qualquer. Importa-se de nos falar a esse respeito?

— Peço desculpa de chegar atrasada, senhora Presidente, mas creio que acabamos de ganhar o jackpot cósmico. Nós… É… Permita que tente explicar deste modo: em tempos clássicos, há milhares de anos, quando o pergaminho escasseava, as pessoas voltavam a escrever sobre um antigo pergaminho, dizendo aquilo que se chama um «palimpsesto». Havia escrita sob escrita sob escrita. Este sinal de Vega é, evidentemente, muito forte. Como sabe, há os números primos e, «debaixo» deles, naquilo que se chama «modulação de polarização», essa fantástica história do Hitler. Mas debaixo da seqüência dos números primos e debaixo da transmissão olímpica retransmitida acabamos de descobrir uma mensagem incrivelmente rica — pelo menos estamos muito convencidos de que é uma mensagem. Tanto quanto podemos dizer, esteve lá sempre. Nós acabamos de a detectar. É mais fraca do que o sinal de anúncio, mas sinto-me embaraçada por não a ter descoberto mais cedo.

— Que diz? — perguntou a presidente. — De que trata?

— Não fazemos a mais vaga idéia, senhora Presidente. Algumas das pessoas do Projeto Argus descobriram-na inesperadamente esta manhã, hora de Washington. Estivemos a trabalhar no assunto toda a noite.

— Através de um telefone vulgar? — perguntou Kitz.

— Com codificação comercial-padrão.

Ellie estava um pouco afogueada. Abriu a caixa do telefax, preparou rapidamente um printout de transparência e, com um projetor de teto, projetou a sua imagem num écran.

— Está aqui tudo quanto sabemos até agora. Obteremos um bloco de informação contendo cerca de mil bits. Haverá uma pausa e depois o mesmo bloco será repetido, bit por bit. Em seguida haverá outra pausa e passaremos ao bloco seguinte. Também é repetido. A repetição de todos os blocos pretende provavelmente minimizar a possibilidade de erros de transmissão. Eles devem pensar que é muito importante recebermos com toda a precisão seja o que for que estão a transmitir. Chamemos a cada um destes blocos de informação uma página. Argus está a captar algumas dúzias destas páginas por dia. Mas não sabemos de que tratam. Não são um simples código pictográfico como a mensagem olímpica. Isto é algo muito mais profundo e muito mais rico. Parece ser, pela primeira vez, informação que eles criaram. A única pista que temos até agora é a de que as páginas parecem estar numeradas. Ao princípio de cada página há um número em aritmética binária. Estão a ver este aqui? E, todas as vezes que aparece outro par de páginas idênticas, está rotulado com o número seguinte mais alto. Neste momento estamos na página… dez mil quatrocentos e treze. É um grande livro. Por cálculo retroativo, parece que a mensagem começou há cerca de três meses. Tivemos sorte em captá-la assim tão ao princípio.

— Eu tinha razão, não tinha? — Kitz inclinou-se por cima da mesa para Der Heer. — Não se trata do gênero de mensagem que queiramos entregar aos Japoneses, ou aos Chineses, ou aos Russos, pois não?

— Vai ser fácil decifrá-la? — perguntou a presidente falando acima do murmúrio de Kitz.

— Claro que faremos os nossos melhores esforços nesse sentido. E provavelmente será útil se a National Security Agency também trabalhar nela. Mas, sem uma explicação de Vega, sem um livro de instruções, digamos, acho que não vamos progredir muito. Não parece, a esse respeito não restam dúvidas, estar escrito em inglês, alemão ou qualquer outra língua da Terra. A nossa esperança é que a mensagem chegue ao fim, talvez na página vinte mil ou na trinta mil, e depois recomece do princípio, para que possamos colmatar as brechas, as partes que faltam. Talvez antes de a Mensagem integral se repetir haja um livro de instruções, uma espécie de McGuffey’s Reader, que nos permita compreendê-la.

— Se me permite, senhora Presidente…

— Senhora Presidente, este é o doutor Peter Valerian, do California Institute of Technology, um dos pioneiros neste campo.

— Queira dizer, doutor Valerian.

— Esta é uma transmissão intencional para nós. Eles sabem que estamos aqui. Fazem alguma idéia, em virtude de terem interceptado a nossa transmissão de 1936, do alcance da nossa tecnologia, da nossa inteligência. Não se dariam a todo este trabalho se não quisessem que compreendêssemos a mensagem. Algures, nesta, encontra-se a chave para nos ajudar a compreendê-la. É apenas uma questão de acumular todos os dados e analisá-los muito cuidadosamente.

— Bem, de que lhe parece que a Mensagem trata?

— Não encontro maneira nenhuma de o dizer, senhora Presidente. Posso apenas repetir o que a doutora Arroway disse. «É uma Mensagem intrincada e complexa. A civilização emissora está ansiosa por que a recebamos. Talvez tudo isto seja um pequeno volume da Encyclopaedia Galactica. A estrela Vega tem cerca de três vezes mais massa do que o Sol e é cerca de cinqüenta vezes mais luminosa. Em virtude de queimar o seu combustível nuclear tão depressa, tem uma duração de vida muito mais curta do que o Sol…

— Sim, talvez algo esteja prestes a correr mal em Vega — interrompeu o diretor da Central Intelligence. — Talvez o seu planeta vá ser destruído. Talvez eles queiram que quaisquer outros saibam da sua civilização antes de desaparecerem.

— Ou — opinou Kitz — talvez andem à procura de um novo lugar para se mudarem, e a Terra convir-lhes-ia perfeitamente. Talvez não tenha sido por acaso que optaram por enviar-nos uma imagem de Adolph Hitler.

— Calma — pediu Ellie —, há uma quantidade de possibilidades, mas nem tudo é possível. Não existe nenhuma maneira de a civilização emissora saber se estamos a receber a Mensagem, e muito menos se estamos a fazer algum progresso na sua decifração. Se considerarmos a Mensagem ofensiva, não somos obrigados a responder. E, mesmo que respondêssemos, eles só receberiam a resposta ao fim de vinte e seis anos, e passariam mais vinte e seis anos antes de poderem responder-lhe. A velocidade da luz é grande, mas não é infinitamente grande. Estamos muito bem isolados de Vega. E, se houver alguma coisa que nos preocupe a respeito desta nova Mensagem, dispomos de décadas para decidir o que fazer a seu respeito. Não entremos já em pânico. Pronunciou as últimas palavras ao mesmo tempo que dirigia um sorriso agradável a Kitz.

— Aprecio essas palavras, doutora Arroway — declarou a presidente. — Mas as coisas estão a acontecer depressa. Demasiado depressa. E há demasiados «talvez». Ainda não fiz sequer uma comunicação pública a respeito de tudo isto. Nem sequer dos números primos, quanto mais da baralhada do Hitler. Agora temos de pensar nesse «livro» que diz estarem eles a enviar. E, em virtude de vocês, cientistas, não se coibirem nada de falar uns com os outros, os boatos voam. Phyllis, onde está aquela pasta? Cá está, olhe para estes cabeçalhos.

Brandidos sucessivamente de braço estendido, todos eles transmitiam a mesma mensagem com pequenas variações de arte jornalística: «Doutora espacial fala de radiespetáculo de monstros com olhos de insetos», «Telegrama astronômico aponta para existência de inteligência extraterrestre», «Voz do céu?» «Vêm aí os alienígenas! Vêm aí os alienígenas!». A presidente deixou os recortes cair para a mesa.

— Pelo menos a história do Hitler ainda não transpirou. Estou à espera desses cabeçalhos: «Hitler vivo e bem no espaço, dizem EUA.» E pior. Muito pior. Acho que seria conveniente interromper esta reunião e voltarmos a reunir-nos mais tarde.

— Se me permite, senhora Presidente — interveio Der Heer hesitantemente, com evidente relutância. — Peço que me desculpe, mas há algumas implicações internacionais que creio deverem ser debatidas agora.

A presidente limitou-se a suspirar, aquiescente. Der Heer continuou:

— Diga-me se o que vou dizer está certo, doutora Arroway. Todos os dias a estrela Vega nasce sobre o deserto do Novo México e depois vocês recebem seja qual for a página desta complexa transmissão — seja ela o que for — que suceda eles estarem a enviar para a Terra nesse momento. Oito horas mais tarde, ou coisa parecida, a estrela põe-se. Certo até agora? Muito bem. No dia seguinte, a estrela volta a nascer a oriente, mas vocês perderam algumas páginas durante o tempo em que foi impossível observá-la, depois de ela se ter posto na noite anterior. Certo? Portanto, é como se estivessem a receber páginas que passam de trinta para cinqüenta e depois de oitenta para cem, etc. Por muito pacientemente que observemos, vão-nos faltar enormes quantidades de informação. Lacunas. Mesmo que eventualmente a mensagem se repita, vamos ter lacunas.

— É inteiramente certo. — Ellie levantou-se e aproximou-se de um enorme globo do mundo. Era evidente que a Casa Branca se opunha à obliqüidade da Terra; o eixo daquele globo era desafiadoramente vertical. Hesitante, ela fê-lo girar. — A Terra gira. Precisamos de radiotelescópios regularmente distribuídos por muitas longitudes, se não queremos lacunas. Qualquer outra nação que observe apenas o seu próprio território vai imergir na mensagem e emergir da mensagem — talvez até nas partes mais interessantes. Este é um problema do mesmo tipo que uma nave espacial interplanetária americana enfrenta. Transmite as suas descobertas para a Terra quando passa por algum planeta, mas os EUA podem estar voltados para o outro lado nessa altura. Por isso, a NASA tratou do necessário para que três estações radiorrastreadoras fossem regularmente distribuídas em longitude à volta da Terra. Ao longo das décadas têm desempenhado soberbamente o seu papel. Mas a sua voz emudeceu timidamente e ela olhou de frente para P. L. Garrison, o administrador da NASA.

Homem magro, macilento e de ar amigável, ele pestanejou.

— Obrigado. Sim. Chama-se Deep Space Network e orgulhamo-nos muito dela. Temos estações no deserto do Mojave, em Espanha e na Austrália. Claro que os fundos não chegam, mas, com uma pequena ajuda, creio que conseguiríamos acelerar.

— Espanha e Austrália? — perguntou a presidente.

— Para trabalho puramente científico — disse o secretário de Estado. — Estou certo de que não há nenhum problema. No entanto, se este programa de investigação tivesse implicações políticas, poderia tornar-se um pouco arriscado.

As relações americanas com ambos os países tinham arrefecido ultimamente.

— Não existe dúvida nenhuma de que isto tem implicações políticas — declarou a presidente, um pouco agastada.

— Mas nós não temos de ficar presos à superfície da Terra — interveio um general da Força Aérea. — Podemos vencer o período de rotação. Precisamos apenas de um grande radiotelescópio em órbita terrestre.

— Muito bem — disse a presidente, a olhar em redor da mesa. — Temos um radiotelescópio espacial? Quanto tempo levaria a pôr um no ar? Quem percebe disso? Doutor Garrison?

— Hum… não, senhora Presidente. Nós na NASA apresentamos uma proposta para o Maxwell Observatory em cada um dos últimos três anos fiscais, mas o OMB retirou-a todas as vezes do orçamento. Temos um estudo de concepção pormenorizado, evidentemente, mas seriam precisos anos em, pelo menos três anos — para podermos pô-lo no ar. E acho que devo recordar a toda a gente que, até ao último Outono, os Russos tiveram a funcionar em órbita terrestre um telescópio de onda milimétrica a submilimétrica. Não sabemos por que motivo falhou, mas eles estariam em melhor situação para enviar uns cosmonautas lá acima, arranjá-lo, do que nós para construir e lançar um a partir do zero.

— É assim? — perguntou a presidente. — A NASA tem um telescópio vulgar no espaço, mas não tem nenhum grande radiotelescópio. Não há já lá em cima alguma coisa apropriada? A respeito da comunidade da informação? A National Security Agency? Ninguém?

— Portanto, para acompanhar esta linha de raciocínio — interveio Der Heer —, temos de convir que se trata de um sinal forte e numa quantidade de freqüências. Depois de Vega se pôr nos Estados Unidos da América, há radiotelescópios em meia dúzia de países que estão a detectar e a registrar o sinal. Não são tão sofisticados como o Projeto Argus, e provavelmente ainda não se deram conta da modulação de polarização. Se aguardarmos até prepararmos e lançarmos um radiotelescópio, a mensagem pode acabar entretanto, desaparecer para sempre. Não parece, então, que a única solução é a cooperação imediata com um certo número de outras nações, doutora Arroway?

— Não creio que qualquer nação seja capaz de realizar este projeto sozinha. Serão necessárias muitas nações, dispostas em longitude, a toda a volta da Terra. Envolverá a utilização de todas as grandes instalações de radioastronomia agora em funcionamento — os grandes radiotelescópios da Austrália, da China, da Índia, da União Soviética, do Médio Oriente e da Europa Ocidental. Seria irresponsável se acabássemos por ficar com lacunas na cobertura porque alguma parte crítica da Mensagem tivesse chegado quando não se encontrava nenhum telescópio apontado a Vega. Teremos de fazer alguma coisa a respeito do Pacífico oriental entre o Havaí e a Austrália, e talvez alguma coisa a respeito do Médio Atlântico.

— Bem — observou a contragosto o diretor da Central Intelligence —, os Soviéticos têm diversos navios rastreadores de satélites que são bons em banda S para banda X, o Akademik Keldysh, por exemplo. Ou o Marshal Nedelin. Se chegarmos a algum acordo com eles, talvez possam estacionar navios no Atlântico ou no Pacífico e preencher as lacunas.

Ellie franziu os lábios para responder, mas a presidente já estava a falar:

— Está bem, Ken, talvez tenha razão. Mas eu repito que esta coisa está a andar demasiado depressa. Há alguns outros assuntos que tenho de resolver neste momento. Gostaria que o diretor da Central Intelligence e o pessoal da National Security trabalhassem durante a noite para se saber se temos quaisquer opções além da cooperação com outros países especialmente com países que não são nossos aliados. Gostaria que o secretário de Estado preparasse, em cooperação com os cientistas, uma lista contingencial de nações e indivíduos a serem abordados se tivermos de cooperar e uma certa avaliação das conseqüências. Haverá alguma nação susceptível de ficar furiosa conosco se a não convidarmos para ficar à escuta? Poderemos ser vítimas de chantagem da parte de alguém que prometa os dados e depois os sonegue? Devemos tentar ter mais de um país em cada longitude? Analisem as implicações. E, pelo amor de Deus — os seus olhos passaram de rosto em rosto à volta da comprida mesa polida —, não abram a boca a este respeito. Você também, Arroway. Já temos problemas suficientes.

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