CAPÍTULO III OS TORPEDEIROS DE SOIS MORTOS

Não nos demoramos no planeta dos kaïens. Chegamos a Ella pelo meio do dia. Eu estava esgotado, nervoso, ansioso. Hélon, perante o meu pedido, tinha replicado que me daria a resposta em Ella, na noite da chegada.

Deixando Ulna, ainda muito abatida, no Tsalan, parti para a sala do Conselho, com Souilik, O meu relato, tão preciso quanto possível, concluía por afirmar que os Hiss pareciam, infelizmente, ter razão e que toda a possibilidade de coexistência de Milsliks e humanidades era impossível, pelo menos no mesmo sistema solar. «Mas», acrescentei, «se devemos defender ciosamente as nossas galáxias, não vejo possibilidade de exterminar os Milsliks, que são, certamente, trilhões em milhões de galáxias».

Esta conclusão não agradou a maioria da assembléia. Para além da ameaça que fazem pesar sobre qualquer vida protoplasmática, os Milsliks representam para os Hiss o inimigo metafísico, o princípio do Mal, que deve ser aniquilado do universo.

Um dos Sábios me disse:

— Afirma você que Siphan tinha sido um planeta humano conquistado pelos Milsliks. Por que não se contentam eles com planetas gelados, que nós não poderemos habitar? Por que extinguem os nossos sóis? Não, não pode haver nenhum compromisso possível. Têm de desaparecer!

— Mas a luta durará milhões de anos! Por mais poderosas que sejam as armas, vocês não poderão reconquistar os planetas um a um! E que farão desses mundos gelados que não podem habitar? Esquecendo totalmente que era um Hiss de adoção, quase tomava o partido dos Milsliks.

— Nada podemos fazer desses planetas mortos, ainda que eles contenham matérias úteis. Existem bastantes mundos vivos desertos. Mas os Milsliks devem desaparecer.

E, dado que o calor e a luz os matam, nós reacenderemos os seus sóis!

Ignorando a mais elementar delicadeza, gritei: — O que?

— Snisson disse que reacenderemos os sóis — respondeu Azzlem. — Ou, pelo menos, tentaremos. Teoricamente é impossível. Na prática arrisca-se a ser mais difícil. Mas tentaremos. Durante a sua ausência começaram já as experiências preliminares.

Poremos você ao corrente de tudo no momento oportuno.

Fiquei estarrecido! Depois da minha partida da Terra já vira suceder as coisas mais fantásticas. Admitia — era forçado a isto, visto que vira com os meus olhos — que os Milsliks, esses estranhos seres, tinham o poder de extinguir estrelas. Mas que os Hiss — que, apesar de tudo, não deixavam de ser homens — pensassem em reacendê-las… Estava me sentindo dominado por uma vertigem. Azzlem prosseguiu calmamente:

— Não creio que a experiência decisiva possa ser realizada em menos de um ano.

Entretanto, continuaremos talvez a explorar as Galáxias Malditas, mas sem fazer grandes ofensivas, que apenas serviriam para matar inutilmente Hiss ou Sinzus.

Com estas palavras foi a sessão encerrada. Saí, juntando-me a Souilik, que me aguardava. Repeti-lhe o que ouvira.

— Eu sei. Acaba de ser formada uma equipe especial de físicos, a qual inclui, sob a direção do Sinzu Béranthon e de Assza, uma centena de Hiss e quase outro tanto de representantes. de cada humanidade. A nossa amiga Beichit faz parte da delegação hr'ben. Sabe quem comandará os ksills encarregados da realização do projeto?

— Não.

— Eu mesmo. E você talvez seja encarregado das equipes de desembarque. O seu aspecto é de quem saberá se desempenhar bem disso — acrescentou rindo.

O Tsalan tinha descido no local habitual. Afastei-me dele e fui passear perto da margem, no sítio onde vira Ulna pela primeira vez. Me parecia um mau indício que Hélon não me tivesse dado uma resposta imediatamente. Desejava e temia, simultaneamente, o pôr do sol. O céu estava sem nuvens, como a suave cor malva que se vê em Ella quando o tempo está úmido, na altura de Ialthar desaparecer. Me sentei na areia fina.

Atrás de mim ouvi passos. Um Sinzu aproximava-se e saudou:

— Song Vsévold Clair, o ur-shémon aguarda você — disse, dando-me o meu título sinzu.

Segui-o. A proa do Tsalan estendia o seu gigantesco cone por Cima das nossas cabeças. Hélon me aguardava no posto central, com Akéion e cinco idosos Sinzus, entre os quais Vincédon — Você ontem me pediu minha filha Ulna como esposa começou ele sem circunlóquios inúteis. — Teoricamente, tem esse direito: você é Sinzu — Then e Song.

Mas, tendo consultado os nossos amigos Hiss, concluímos que seria a primeira vez que se verificaria um casamento entre humanidades diferentes. Até o nosso encontro não conhecíamos nenhuma que estivesse suficientemente próxima da nossa para que uma tal união pudesse ser encarada. Nunca se verificaram casamentos entre os Hiss e os Krens, os quais se lhes assemelham tanto que os próprios Hiss é com dificuldade que os distinguem dos seus compatriotas. Mas os nossos biologistas afirmam, por terem examinado você durante a sua passagem pelo hospital, que, quimicamente, o seu protoplasma é indiscernível do nosso. Você tem, de resto, fragmentos de ossatura sinzus, artérias sinzus, tecidos sinzus. O seu metabolismo é idêntico ao nosso, tem o mesmo número de cromossomas e, provavelmente, o mesmo número de genes. O seu caso é, portanto, único. Só há uma diferença: é que você tem cinco dedos, em vez de quatro, mas os nossos antepassados tinham também cinco dedos. Parece, portanto, não haver nisso obstáculos, fora dos psicológicos. Mas Ulna — e sorriu — consente. Em consequência, dou a minha aprovação. Dado que nas famílias de shémons nenhum casamento se deve realizar fora de Bérisenkor, capital de Arbor, vocês partirão para lá desde que os Hiss o permitam. Digo desde que os Hiss o permitam porque, se você é Sinzu-Ten, é também Hiss e igualmente Terrestre. Me interrogo, com ansiedade — gracejou ele —, a que planeta pertencerão os filhos de vocês dois!

Durante todo este discurso eu estivera sobre brasas. A decisão me encheu de alegria. Me inclinei segundo o cerimonial sinzu. Agradecer teria sido uma indelicadeza: só se agradecem as dádivas de pouco valor. — Uma advertência: — disse ainda.Hélon — segundo o nosso costume, você não deve procurar se encontrar com Ulna agora. Só a verá no dia do casamento. Mas ninguém impede de você enviar mensagens para ela.

Saí do Tsalan com o coração aliviado. Caí sobre o inevitável Souilik, a quem dei a boa nova.

— Então toda a gente se casa! — volveu ele — Essine e eu, Ulna e você, e acabo de estar com Beichit, que me anunciou o seu enlace com Séfer. Apenas, no seu caso, você está em falta com os nossos costumes.

— Como pode ser isso?

— Você foi o meu stéen-sétan, e ainda não há um ano que casei. Você me deve a multa tradicional: um bloco de platina da grossura de um punho! Hoje, se não conseguir um, o primeiro laboratório que apareça terá muito prazer em fabricar um…

Creio que o seu casamento se. realizará em Arbor. Como é que você irá? Sei que o Conselho quer conservar aqui todas as astronaves sinzus. Quer que lhe conduza no meu ksill?

E foi assim que, três dias depois, Souilik, Essine, Hélon, Akéion e eu partimos para Arbor, com Ulna fechada num compartimento, para que eu não a pudesse ver.

Um dia lhe contarei as suntuosas cerimônias que se desenrolam no casamento da filha de um ur-shémon, Falarei também dos esplendores desse planeta Arbor. Assim como Ella é um mundo calmo e sereno, assim como os planetas mortos são mundos de horror, Arbor é uma terra bravia e bela, com os seus oceanos de um azul-violeta, as suas montanhas de vinte quilômetros de altura, as imensas florestas verdes e púrpuras, as quais os Sinzus velam com um cioso cuidado. Oh! nunca esquecerei a curta estada que fiz, após o meu casamento, no vale de Tar. Ali ficamos apenas seis dias de Arbor, isto é, cerca de oito vezes vinte e quatro horas terrestres. Havia uma moradia reservada para noivos, no meio de uma floresta, a meia encosta de uma vertente onde correm as águas azuis do glaciar. Alguns quilômetros mais abaixo, a torrente, retida por um dique, forma um lago, nas margens do qual se ergue a agradável cidade de Nimoê. E, no entanto, nenhum Sinzu ultrapassa o limite invisível que separa o vale reservado do lago. É um velho costume, que existia também, creio eu, nos nossos índios apaches, esse de os jovens casais terem de passar alguns dias completamente isolados. Segundo o meu ponto de vista, é de inscrever isto no ativo da civilização sinzu.

No passivo, também segundo a minha opinião, é necessário inscrever a mania das cerimônias: nenhum povo, com exceção, talvez, do chinês, é cerimonioso a este ponto. Uma vez decorridos os nossos seis dias de solidão, tive de participar de uma série de festas, de visitas. A ignorância dos costumes me fazia sempre recear cometer faltas, e me senti aliviado quando os shémons me comunicaram que podia regressar a Ella logo que me aprouvesse.

Tive ainda em Arbor uma estranha experiência. Akéion me conduziu um dia, ao principal observatório do planeta, no hemisfério austral. E aí os astrônomos me mostraram, perdido na constelação de Brénoria, uma pálida mancha de luz: a nossa galáxia. No mais potente instrumento — que não é inspirado no princípio do telescópio — essa mancha resumia-se a uma poeira de estrelas, dispostas em espiral. Entre essas estrelas, perdido na irradiação delas, encontrava-se o nosso humilde Sol. E em volta dessa estrelinha girava a minha Terra natal, tão longe, tão pobremente invisível. A luz que eu via tinha partido há mais de oitocentos mil anos e, admitindo que a ciência dos Sinzus tivesse permitido ver a Terra, tudo o que eu podia esperar perceber seriam, talvez, algumas miseráveis famílias de pitecantropos, na orla de uma floresta.

Agora, que regressei a Terra, sempre que a noite ou o tempo o permitem, Ulna e eu observamos a nebulosa de Andrômeda. Vê-la faz-me tocar com o dedo, se assim se pode dizer, a imensidade das distâncias que percorri. A galáxia dos Hiss é muito longe, está fora do alcance mesmo dos nossos telescópios gigantes. Mas ver esta pequena opala e pensar que a mulher que está ao meu lado lá nasceu e eu aí estive!…

Ao cabo de três meses regressamos. Souilik veio nos procurar, como estava combinado. Decolamos do astro-porto de Bérinsenkor, repleto de enormes astronaves que asseguram a ligação entre Arbor e os outros planetas colonizados pelos Sinzus.

O nosso ksill parecia minúsculo ao lado deles.

Mal tínhamos partido, Souilik me confirmou que eu faria parte do seu estado-maior de «torpedeiros de sóis mortos». Parecia ter me tornado uma personagem importante em Ella. Me interroguei, durante muito tempo, sobre o motivo por que os Hiss não cessavam de me nomear para cargos importantes… e perigosos! Estaria certamente mais adequado numa equipe de biologistas. Os Sinzus não deixavam de participar, como eu, da imunidade perante as irradiações Milsliks e, além disso, eram excelentes físicos. Mas creio que os Ellianos tinham levado a peito a minha integração, e para eles eu era, portanto, um Hiss, um Hiss de sangue vermelho, e não um estrangeiro, como os Sinzus. Além disso, há entre mim e Souilik uma profunda e verdadeira amizade e, insistindo para que eu o acompanhasse, este jovem Hiss, excepcionalmente aventureiro, neste povo de aventureiros científicos, fazia-me a mais bela oferta que estava ao seu alcance: a aventura!

Aconteceu inúmeras vezes amaldiçoar, não, de qualquer forma, esta amizade, mas as suas consequências!

Quando regressamos a Ella nos instalamos numa casa da ilha Bressié. Ulna e «minha irmã Assila» entenderam-se muito bem. Continuamos a trabalhar cerca de um ano na nossa equipe de biologistas, procurando forma de imunizar totalmente os Hiss contra as irradiações dos Milsliks. Finalmente isso nos pareceu teoricamente impossível: as ondas particulares emitidas pelos Milsliks destroem o pigmento respiratório dos Hiss e de todas as humanidades, salvo os Sinzus e nós. E, a não ser que se mude de pigmento respiratório — o que é, evidentemente, impossível —, nada há a fazer. Assza estudou o problema do ponto de vista da física e chegou exatamente ao mesmo resultado. No entanto, conseguimos, através da injeção de certas substâncias químicas, retardar a ação lítica durante algum tempo, desde que não se tratasse de uma radiação muito intensa.

Certa noite, quando saímos do laboratório, Souilik nos levou até ao seu ksill e, sem quaisquer explicações, decolou. Eu começara a me familiarizar com a condução destes engenhos, pelo que, ao cabo de algum tempo, percebi que estávamos a caminho de Marte. Nem Ulna nem eu lá fôramos alguma vez, e, assim, encaramos a viagem com satisfação. De resto, foi feita na velocidade espacial máxima para esta distância, o décimo da velocidade da luz.

Marte é um planeta bravio, que se assemelha um pouco a Arbor, mas ainda mais árido. Sobrevoamos o solo de muito alto e, depois, Souilik desceu o ksill sobre uma enorme construção, a principal fábrica onde eram construídos os ksills para todos os planetas. Que o termo «fábrica» não lhe desperte a idéia de ruído insuportável. Os Hiss têm horror ao ruído, pelo que ali tudo se passava em silêncio, ou quase. Os ksills eram dispostos em cadeia por autômatos, que alguns, poucos, Hiss vigiavam.

Passamos por vastos átrios sem nos determos e Souilik introduziu-nos num enorme hangar, onde estava sendo construído um ksill de proporções titânicas: medindo mais de trezentos metros de diâmetro, com uma espessura de sessenta metros, não tinha a forma lentilhar clássica, mas sim a de um zimbório de cúpula abatida. Ficamos uns instantes a contemplá-Ia. Então Souilik nos disse:

— Eis a nossa futura nave, com que iremos reacender os sóis.

— Mas qual a razão destas dimensões e desta forma? — perguntei eu.

— São necessárias. O maquinismo que servirá para reacender os sóis é enorme e não pode ser lançado. Teremos, portanto, de aterrar sobre a superfície das estrelas mortas. Você sabe tão bem como eu que, nelas, a fôrça da gravidade é terrível, e, assim, ficaríamos esmagados sobre o nosso próprio peso se não dispuséssemos de um poderoso campo anti-gravítico Para gerar este campo será necessário despender uma energia fantástica. Por isso instalar-se-á uma verdadeira central neste ksill. A forma de zimbório permitirá uma resistência melhor ao seu próprio peso Mas, de qualquer forma, duvido muito que possamos ficar mais de um basike sobre um sol morto!

Vários meses passaram ainda. Pouco a pouco, me habituei à idéia de participar nesta expedição extraordinária. Os dias escoavam-se, muito calmos. Pelo menos, pareciam calmos. Mas nos Três Planetas tudo o que o universo tinha de cérebros prodigiosamente dotados trabalhava dia e noite na grande obra. As vezes, no entanto, punha-me a pensar, contemplando as tranquilas paisagens de Ella, que toda esta serenidade encobria uma atividade vertiginosa. E me sentia perdido, levado para longe, como um pobre ser sem destino.

No laboratório trabalhava com afinco. Me considerava como que uma espécie de enviado da Terra, o representante da nossa civilização, tão orgulhosa da sua técnica, ultrapassada — oh, quantas vezes! — em todos estes cantos do universo! Estava me parecendo que se fizesse uma descoberta importante afirmaria, desse modo, o meu direito de viver em Ella, deixando de ser um parente pobre, uma curiosidade, para me tornar um membro da comunidade das Terras humanas. Por isso lia até alta noite as publicações hiss e Ulna traduzia para mim os trabalhos sinzus. Graças sejam rendidas aos mestres terrestres: se os meus conhecimentos eram, muitas vezes, insuficientes, os métodos de trabalho eram bons, o que me permitiu assimilar rapidamente as noções necessárias.

O mais curioso é que, enquanto me atormentava daquele modo e gemia sobre a minha ignorância, os Hiss me consideravam já como um bom elemento e haviam colocado, desde há muito, sob as minhas ordens, alguns jovens biologistas. Apesar de a minha organização ser diferente, possuía, realmente, conhecimentos que eram novos para eles, Quanto aos Sinius, se é certo que desenvolveram extraordinariamente a física biológica — curam quase todas as doenças por irradiações apropriadas, tal como os Hiss —, tinham esquecido, ou negligenciado, a química. E foi precisamente neste aspecto que alcancei o resultado de que lhe falei: proteger durante algum tempo os Hiss contra as irradiações Milsliks.

O início da minha vida com Ulna não foi fácil. Os Sinzus são de uma susceptibilidade extrema e eu nem sempre sou paciente. Tínhamos de vencer o abismo que se abria entre as nossas educações, diferentes. Felizmente, o problema religioso não veio complicar as coisas: os Sinzus são agnósticos, tal como eu. Mas múltiplos pequenos pormenores nos indispunham um com o outro; por exemplo — coisa curiosa, para um povo tão cerimonioso —, os Sinzus comem com as mãos (e você pôde verificar, esta noite, que Ulna ainda não está completamente à vontade no uso do garfo); o hábito que tenho de trabalhar até altas horas parecia-lhe incompreensível, como também a minha repugnância em me levantar cedo. Pouco a pouco, estabeleceu-se entre nós um modus vivendi, e as Arborianas têm uma enorme vantagem sobre as suas irmãs da Terra: nunca nos ameaçam de voltar para casa das mães!

Certo dia, quando me aquecia ao sol como um lagarto, conversando com Ulna e Assila, uma sombra interpôs-se entre nós e o astro: era o enorme ksill que víramos em construção no planeta Marte. Conduzido por Souilik, descreveu graciosas evoluções, roçou o teto da minha casa e desapareceu no horizonte. Uma meia hora depois recebia uma mensagem de Azzlem me convocando para partir imediatamente.

Aterrei na esplanada. O enorme ksill balançava suavemente, pousado nas ondas, no extremo do embarcadouro. Souilik me aguardava sozinho.

— Não trouxe Essine? — perguntei.

— Não. Não poderá haver mulheres nesta aventura. Também você não trouxe Ulna!

— Quando partimos?

— Em breve. Ande, os Sábios querem ver você.

Azzlem e Assza nos receberam imediatamente. Azzlem começou abruptamente:

— Slair, vamos lhe pedir, mais uma vez, que leve a cabo uma perigosa missão.

Como você sabe, Souilik conseguiu que fosse incluído no estado-maior do ataque.

Não recusamos, porque não havia nenhum motivo para isso, mas também não julgávamos que seria particularmente útil. Ora dá-se o caso que, provavelmente, será você indispensável, pois já conhece o essencial do projeto: num ksill especial, vocês desembarcarão na superfície solidificada de um sol morto e aí colocarão um pesado aparelho, que vai despertar reações nucleares. Na verdade, parece que ultrapassamos ligeiramente os fins fixados: queríamos reacender simplesmente os sóis. Ocasionaremos explosões, sem dúvida. Mas os planetas que gravitam em sua volta serão também destruídos, ao mesmo tempo que os Milsliks. Tanto pior!

O problema é o seguinte: sobre a superfície dos sóis vocês estarão submetidos a uma gravidade dezenas de vezes mais forte que a de Ella se o ksill não estivesse munido de um dispositivo antigravítico. Mas esse dispositivo consome uma energia fantástica e só poderá funcionar cerca de meio basike. Será necessário que tudo esteja pronto nesse período de tempo, senão é o esmagamento sobre o próprio peso Por outro lado, uma parte do detonador — parte que, por agora, não pode ser dividida nem montada adiantadamente no corpo do aparelho — pesa demasiado, apesar dos nossos esforços, para ser manipulada por um Hiss ou por um Sinzu, nas condições a que vocês estarão submetidos.

— Os autômatos — disse eu. Azzlem deu um «ssii» de irritação.

— Você bem sabe que os autômatos não funcionam nos campos anti-gravíticos Pensamos, portanto, em utilizar a sua fôrça física. Aceita?

— É difícil recusar — exclamei.

— Vamos, portanto, colocar você num intenso campo de gravitação artificial, para ver se será capaz de manipular a tal peça e até que limites. O campo anti-gravítico que a aparelhagem do ksill poderia fornecer será, em duração, inversamente proporcional ao campo do sol morto. Será necessário agir o mais rápido possível.

Venha.

Penetrei pela primeira vez no laboratório de física.· Me vestiram um escafandro especial. Era armado em hastes de metal, articuladas nos joelhos, nos cotovelos e na cintura; o interior era como as combinações de vôo «anti-g» dos nossos aviadores supersônicos. Assim equipado, fui colocado numa plataforma de metal, sob uma cúpula de cobre. No chão estava uma peça metálica complicada. Me abaixei e ergui-a sem esfôrço. Sabia que isso seria quase impossível a um Hiss.

Assza dirigiu-se para um reóstato. — Atenção! Gravidade 2!

Me senti pesado. Erguer a peça foi mais custoso. Pouco a pouco, Assza aumentava a intensidade da gravidade. Então meus braços e pernas se tornaram de chumbo, a circulação se fazia dificilmente e o sangue refluía para os pés, apesar do escafandro.

Depois veio o «véu negro», bem conhecido dos nossos aviadores. Mas, mesmo antes de ele se ter produzido, já não conseguira erguer a peça. Lentamente, Assza levou a gravidade até ao normal.

— Será mesmo difícil — disse. — E provávelmente impossível para certos sóis. É preciso encontrar a forma de tornar a operação astomática Mas poderemos ensaiar na superfície de uma pequena estrela.

No dia seguinte Souilik partiu de novo, com o grande ksill que devia ser acabado de construir na ilha Aniasz. Durante um mês não ouvi falar de mais nada. E, de repente, em certo dia, Assza passou pelo laboratório e me anunciou que tudo estava pronto e que partiríamos no dia seguinte para torpedear um sol morto da Galáxia Maldita onde eu já estivera. Nessa noite ficamos na Casa dos Estrangeiros. Ao pôr de Ialthar o grande ksill surgiu do poente e amerissou no extremo da pequena ilha.

Alguns minutos mais tarde Souilik apareceu, acompanhado por Essine, Assza, Beichit, Séfer, Akéion e Béranthon, o grande físico sinzu. Todo o estado-maior do Sswinss (este nome significa «Destruidor») estava, pois, reunido. Houve uma espécie de banquete, sem discursos. Ulna e eu nos retiramos cedo e fomos passear na praia.

Estava uma temperatura deliciosa e o mar fosforecia, em grandes ondulações lentas.

Ari e Arzi difundiam a sua luz fria, as estrelas brilhavam aos milhares. Baixo, no horizonte, Kalvénault cintilava ainda, um pouco mais vermelho. O luar argênteo das luas recortava as sombras dos bosques. Nos sentamos, fitando a vaga a se desfazer na praia em espuma.

Ali ficamos muito tempo sem falar. Que poderíamos nós dizer? O drama que se preparava ultrapassava-nos! Já não me era possível recuar, e, de resto, não era essa a minha intenção, apesar do medo que me sacudia o corpo. Ulna sabia que desta vez não podia me acompanhar. Perto do mar, do nosso lado esquerdo, surgiu um outro par. As elegantes silhuetas, um pouco franzinas, denotavam serem Hiss.

Aproximaram-se e reconhecemos Souilik e Essine. Me levantei para os chamar, mas Ulna puxou-me pela túnica, dizendo:

— Não. Também eles têm de se separar.

Fiquei calado. Passaram diante de nós sem nos ver e afastaram-se para a direita.

Pouco depois voltaram para o nosso lado. Já não estavam sós. Os seus companheiros eram ainda mais frágeis e adivinhei que se tratava de Beichit e Séfer.

Desta vez, quando passaram perante nós, chamei-os e eles vieram se sentar ao nosso lado. Tirei o cachimbo do bolso e acendi-o. Se bem que os Hiss não fumem e achem até este vício singular, existe em Ella uma planta que é melhor do que o tabaco terrestre, sem ser tão nociva como este Trouxe comigo, para aqui, algumas dessas plantas, que, no entanto, não se puderam aclimatar. Acendi, pois, o meu cachimbo e esse gesto me transportou a alguns anos atrás. Uma vez, em 1944, precisamente antes de embarcar para a costa da Provença, fumara o meu último cachimbo diante do Mediterrâneo, acompanhado por camaradas, muitos dos quais deveriam cair mortos, a meu lado, alguns dias depois. Me voltei para Souilik.

— Que probabilidades temos de regressar, na sua opinião? Me respondeu com uma locução hiss: — É a mordidela do stissnassan!

O stissnassan é um verme de Ella cuja cabeça é tão semelhante à cauda que as pessoas se enganam uma vez em duas sobre a sua posição. E prosseguiu:

— Provavelmente não há Milsliks nos sóis mortos. O perigo não reside nisso. Mas nós disporemos de muito pouco tempo para lançar o kilsim. Tudo dependerá, possivelmente, da sua fôrça. Ao contrário dos Sábios, eu talvez esperasse poder fabricar autômatos que funcionassem nos campos anti-gravíticos Mas, por outro lado, a construção dos kilsims devora uma enorme quantidade de energia, e se, no fim de contas, eles não podem servir, mais vale isso ser verificado já e utilizar essa energia para outro fim.

— Mas certamente que você conseguirá — exclamou Beichit, indignada.

— Beichit faz parte da equipe dos construtores — replicou Souilik, num tom ligeiramente sarcástico. — É natural que tenha plena confiança no seu engenho. Por minha parte, ficarei mais tranquilo quando ele estiver funcionado. Ainda não seria nada, se ele se contentasse em não funcionar. Explodirá de qualquer forma. Mas temos de triunfar… ou perecer!

— Mas porque? — interroguei eu.

— O kilsim é ainda um engenho experimental… e perigoso. Uma vez assentada a penúltima peça, você terá precisamente um minuto terrestre para a colocar. Assim mesmo, se conseguir, a explosão se dará um basike depois. Se falhar, verificaremos dois minutos depois. Inútil dizer que neste último caso não teremos tempo para nos afastarmos. Quanto a passar para o ahun, na proximidade de um campo gravítico tão potente, nos arriscamos a ir parar em algum universo negativo. E nem toda a gente tem a sorte de Akéion. Mas não se inquiete. No seu minuto farei dar o máximo ao campo antigravítico. Você conseguirá!

Arzi descia lentamente para trás do horizonte. Levantou-se um vento fresco.

Ficamos silenciosos. Depois Ulna entoou, a meia voz, o canto dos Conquistadores do Espaço. Quando chegou ao verso sobre «os que a morte levou para os seus mundos desconhecidos» deu um breve soluço, mas prosseguiu. Com uma voz baixa e muito pura, Beichit entoou, por sua vez, um antigo canto do seu planeta, lento e obscuro como se fosse um sortilégio. Depois me pediram que cantasse uma canção da Terra, e não encontrei melhor do que a rude ária dos corsários de Jean Bart:

São homens de muita coragem Os que conosco partirão…

Exato, pensava eu. Que foram as viagens dos navegadores de outrora ao lado desta fantástica tarefa: reacender um sol?!

Séfer, calado até aí, disse:

— Aconteça o que acontecer, os planetas humanos poderão se orgulhar de nós. Se falharmos, outros, mais tarde, triunfarão. Mas nós teremos sido os primeiros!

Sim — retorquiu Souilik. — Mas tenhamos o cuidado de não nos comportarmos como Ossinsi!

Quem era Ossinsi?

O mais famoso dos guerreiros de Ella-Ven, há alguns milênios. — A canção ainda existe… É a sua vez, Essine!

Constituindo um dueto, cantaram os feitos de Ossinsi. Era uma tão famoso guerreiro que nunca pôde matar ninguém, pois o inimigo debandava só de ouvir o seu nome. Certo dia encontrou um velho eremita que nunca ouvira falar dele e ao qual perturbara as orações. Longe de fugir, o homem invetivou-o violentamente. E

Ossinsi, intimidado por ter diante dele alguém que ousava increpá-lo, fugiu tão depressa que ainda hoje corre. Com esta nota irônica fomos dormir.

Partimos ao romper da aurora. Essine, Beichit e Ulna nos acompanharam ao embarcadouro. Fizemos as últimas despedidas e, então, a porta de metal se fechou sobre nós.

A primeira parte da viagem não teve história. A passagem para o ahun notou-se simplesmente por um balanço mais forte do que o habitual, devido as grandes dimensões do ksill. Emergimos na Galáxia Maldita, mas Souilik não pôde me dizer se estávamos longe ou perto do planeta Siphan, onde eu permanecera um tão angustioso mês. Passamos suficientemente perto de um planeta para verificar se era povoado por Milsliks. O sistema solar que íamos destruir nos pareceu comportar uma dúzia de planetas, mas, claro, este número era apenas um cálculo. Descemos, então, para o sol morto.

Eu estava com Béranthon, Akéion, Séfer e Souilik no posto de comando, o séall.

Além dos instrumentos habituais, que eu aprendera a utilizar ou compreender, havia uma nova quantidade de mostradores, controlando a aparelhagem especial.

— Só atingiremos o sol morto dentro de alguns basikes — disse Souilik. Será talvez útil que Béranthon lhe mostre exatamente o que terá de fazer.

Segui o físico. O Sswinss comportava uma equipe de cinquenta homens apenas: vinte e cinco Hiss e outros tantos Sinzus. A maior parte do ksill era ocupada por uma imensa divisão circular, cujo chão estava dividido em duas partes: sobre um círculo central erguia-se uma máquina pesada e maciça, oval. com cerca de três metros de altura e trinta de largura. Estava inacabada e, ao lado dela, pousadas sobre o chão metálico, encontravam-se as peças que a deviam completar. Entre elas vi a que eu devia manipular. Nos extremos deste círculo central estavam os geradores de campo antigravítico, sob cuja ação deveríamos trabalhar.

— Logo que pousemos — disse Béranthon — o círculo central que guarda o kilsim se separará. Antes, porém, teremos posto em ação os campos anti-gravíticos Mas para contrabalançar o campo do sol morto consumirão tanta energia que não os poderemos manter funcionando, no total, senão um meio basike, a partir do momento em que tivermos pousado. É necessário ser-se rápido. Mal o kilsim esteja pronto, tornaremos a partir, passaremos para o ahun, bastante longe do sol, e sairemos no Espaço para observar o resultado. Venha até aqui repetir a operação. É simples. Você pegará na peça, introduzirá neste orifício, rodando-a de 90°, empurra e roda de novo 90° no sentido inverso. É tudo. Mas quando eu der o sinal não se demore nem um segundo! Disso depende a vida de todos. Agora ensaie. O kilsim ainda não está carregado e não há nenhum perigo.

Estávamos no Espaço, longe de qualquer campo de gravitação intenso. Foi muito fácil. Repeti o movimento até o fazer de olhos fechados.

— Daqui a pouco a peça pesará mais. Ensaiará uma outra vez antes que acabemos de montar o kilsim.

Não. Isto basta. Prefiro não me fatigar — respondi.

Voltamos ao séall. Ultrapassáramos a zona dos grandes planetas e vogávamos para os planetas interiores. Quando o último desapareceu atrás de nós Souilik ligou os campos anti-gravíticos internos e deu o sinal de alerta. Vestimos os escafandros, mas ficamos ainda no séall. Béranthon e Souilik iniciaram então uma série de delicadas manobras. Não se aterra na superfície de um sol morto como num planeta, por maior que ele seja! Durante um momento o consumo de energia ultrapassou a norma prevista e todos pareceram preocupados, mas depois tornou-se normal.

No entanto, quando estávamos apenas a uma dezena de milhares de quilômetros do nosso alvo, o consumo aumentou novamente e foi necessária uma decisão: continuar, limitando a nossa estada a um terço de basike, em vez de meio basike, ou regressar depressa. A decisão unânime da tripulação e do estado-maior foi que se prosseguisse. Béranthon decidiu apenas iniciar imediatamente a montagem do kilsim, conservando a estrita margem de segurança indispensável.

Salvo Souilik, agarrado ao seu posto de comando, descemos todos para a grande sala. Os geradores anti-gravíticos zumbiam debilmente. As equipes de montagem estavam fatigadas em torno do kilsim. Apesar do campo interno, a gravitação já se fazia sentir pesadamente e a agulha do gravímetro aproximava-se da graduação 2.

Depois ultrapassou-a. Os nossos movimentos tornaram-se pesados e lentos. Por ordem de Béranthon, estirei-me num leito. Tinha de guardar as fôrças para o momento crucial.

Houve um ligeiro choque. O ksill deslizou e imobilizou-se.

Docemente, a plataforma central deslocou-se, deixando-nos na superfície de um sol morto. O ksill, com a sua corôa, subiu a três metros de altura. Por todos os lados se estendia, sob a luz fria dos projetores, uma paisagem de metal e de escórias, em vagas solidificadas. Dispúnhamos de um terço de basike, ou sejam trinta minutos basikianos, para executar o nosso trabalho.

No meu capacete ouvi a voz fria de Souilik, que contava: «vinte e nove, vinte e oito, vinte e sete…».

Mas que faziam os componentes das equipes de montagem?

A mim me parecia que nem sequer se tinham ainda movido. Rodando penosamente a cabeça, vi-os metidos nos escafandros, arrastando os pés, mexendo— se vagarosamente. Apoiado no kilsim, Béranthon orientava-os vocalmente.

«Vinte e cinco… · vinte e quatro… vinte e três…».

A maior parte das peças jazia ainda no chão metálico. Que idiotas todos nós éramos — os Hiss, os Sinzus, os hr'ben e eu mesmo! Se os autômatos não funcionavam nos campos anti-gravíticos, uma simples grua, uma roldana, até, teria, certamente, feito o serviço! Mas a civilização destes senhores tinha esquecido essas primitivas máquinas!

«Vinte… dezenove… dezoito…».

Os campos anti-gravíticos não eram absolutamente constantes, mas flutuavam ligeiramente. Me afundei na cama, me ergui novamente, me deitei de novo.

«Quinze… catorze… treze…».

As últimas peças eram colocadas, pouco a pouco, no seu lugar do conjunto.

Béranthon gritou para mim:

— Atenção. Ao meu sinal, será a sua vez, terá precisamente um minuto terrestre.

Prepare-se!

«Doze… onze… dez…».

— Quando eu baixar o braço começará o seu minuto. Venha cá!

Me ergui e me arrastei penosamente até a peça, que me pareceu monstruosa.

Não, nunca nestas condições conseguirei erguê-la!

«Nove…». —

Béranthon! Não poderei! Para!

«Oito…».

— Muito tarde! É a sua vez!

Baixou o braço. Me curvei, agarrei a peça, possuído duma vontade selvagem. De qualquer maneira, o monstro, agora, estava carregado. No que eu confiava, por ser a nossa única probabilidade de salvação, era no moderador que nos daria o tempo necessário para partir. Com um «han!», ergui-o. Béranthon tinha o meu relógio terrestre e dava-me os segundos.

«Cinquenta e cinco…».

Dei um passo, conseguindo introduzir o extremo da peça no orifício.

«Cinquenta..».

Não, era peso demasiado. Tinha de rodar pra direita ou pra esquerda? O suor banhava o meu escafandro e me corria para os olhos.

«Quarenta…».

E esse idiota do Souilik que prometera fazer funcionar a toda a fôrça os campos anti-gravíticos quando fosse a minha vez!

«Trinta e cinco…».

A minha volta as equipes de montagem fugiam, lentamente, esmagadas pela gravitação. Fiz um violento esfôrço e elevei o outro extremo da peça na altura desejada. Me pareceu sentir um estremecimento no flanco do monstro. E se os Hiss tivessem se enganado? Se fosse rebentar agora?

«Trinta…».

Tomado de panico, rodei a peça no sentido contrário.

— Para o outro lado! Para o outro lado! berrou Béranthon.

«Vinte e cinco…».

Então, subitamente, me pareceu que a peça ficara leve.

Pude rodá-la, fazê-la penetrar. Só me restava rodá-la mais uma vez. Mas em que sentido? No inverso, decerto. Mas para que lado rodara da primeira vez? Com o cérebro parado, fiquei imóvel talvez um segundo.

«Vinte…».

— Como é isto?

A peça rodara sozinha. Maquinalmente, Béranthon tentou limpar o suor que lhe brilhava no rosto.

Dez — disse ele — Sete — respondeu a voz de Souilik. Atenção, vou descer. Embarquem!

O ksill nos cobriu. Uma última vez, lancei um olhar para as vagas de metal solidificado que ninguém mais veria, talvez. Tão depressa quanto podíamos, em passos lentos, subimos para o interior. O ksill decolou, abandonando o disco central sobre o qual se erguia a massa pesada do kilsim. Decresceu sobre nós e desapareceu. Nos dirigimos para as portas estanques e penetramos no ksill. A gravitação era ainda muito forte. Chegamos ao pé das escadas e quando a fôrça começou a decrescer subimos, lentamente, esgotados pela fadiga. E, então, subitamente, quando estava ainda no meio, me tornei leve como se fosse uma pena: acabávamos de passar para o ahun.

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